segunda-feira, 16 de setembro de 2013

AGARREM A DEMOCRACIA PORQUE ELA FOGE...: um artigo de Jorge Marques.


por Jorge Marques (Este texto representa apenas o ponto de vista do autor, não da PASC, nem das associações que a compõem).

 

 

Assistimos nos últimos tempos a fenómenos curiosos na vida pública. Uma espécie de guerrilha entre os vários poderes dos Órgãos de Soberania e digo guerrilha, porque por um lado não há coragem para uma guerra de frente e por outro não há bases para a alimentar.

Um dia tinha que acontecer e tenderá a agravar-se se cada um cumprir bem o seu papel e não se subalternizar ao outro. Quero dizer, estes conflitos são saudáveis, porque nos dão a ideia de que alguém ainda cumpre o seu papel. Será de esperar, na melhor das hipóteses, que no fim dessa guerrilha possa surgir uma nova clarificação dos vários poderes, que se reconheça que a deficiência está na construção do sistema e que houve uma espécie de uns “patos bravos” que nos enganaram na qualidade dos materiais necessários à construção da nossa casa democrática.

Todos sabemos que a Constituição prevê uma separação de poderes entre os vários órgãos de soberania, mas se o prevê, logo se confunde e permite que um governo com maioria e um presidente eleito por essa maioria, façam do país uma espécie de território medieval, tal como está a acontecer. Um território onde a lei é determinada pelo mais forte e sem qualquer respeito pelo direito e pelos contratos existentes.

A Constituição, mãe de todas as leis, foi feita, discutida e aprovada pelos partidos políticos com assento parlamentar. As leis que nos regem são discutidas e aprovadas pelos mesmos partidos e a partir daqui o controlo e a gestão dos conflitos passa para os tribunais, no caso da Constituição para o Tribunal Constitucional e noutros casos para entidades criadas pelo Estado para o exercício desse controlo, como é o caso da Comissão Nacional de Eleições para as eleições.

Assistimos nos últimos tempos a um debate estranho entre o Governo e o Tribunal Constitucional, afinal o garante do cumprimento da Constituição, que existe e foi criado para isso mesmo e não para órgão consultivo do governo.

O Poder Executivo, diga-se o Governo, acusa o Poder Judicial de erros de interpretação da nossa Lei Fundamental, num Tribunal que ainda por cima é eleito em boa parte pelos partidos que agora reclamam. Quer dizer que, o cumprimento dos deveres independentes de um órgão de soberania, são atacados publicamente e da mesma forma que se assobia a um árbitro num estádio de futebol!

E tudo em nome desta democracia …!

O Governo pretende assim, depois de acumular o poder executivo e o legislativo, controlar também o poder judicial e sobretudo a mãe de todas as leis, porque em todas as outras o Parlamento já não representa mais do que a maioria governamental.

Não deixa de ser curioso que sendo o Presidente da República o primeiro a julgar e a defender-se destes atropelos, as críticas e os assobios vão todos para o Tribunal Constitucional.

Assistimos, ainda mal refeitos do absurdo desta situação, a uma contestação semelhante por parte de alguns órgãos de comunicação social, sobretudo as televisões.

Insurgiam-se eles contra uma decisão da CNE, órgão responsável pelo cumprimento das leis eleitorais, que chamava a atenção para o direito à igualdade de todos os candidatos autárquicos. Embora de outro tipo, os argumentos que se utilizavam aqui não eram, no essencial, muito diferentes dos que o governo usou relativamente ao TC.

Em resposta a esta igualdade dos candidatos, garantida pelas tais leis que são aprovadas pelos partidos, alguns jornalistas clamavam que havia uns candidatos mais iguais que os outros e que o direito ao espectáculo se deveria sobrepor ao direito desses cidadãos.

Quer isto dizer também que esses media apenas defendem interesses próprios, defendem a manutenção desta oligarquia partidária, dos agentes que eles construíram e mediatizaram e, mais grave, impedem a renovação de toda a classe política, o que deveria constituir um objectivo nacional prioritário.

O que parece continuar a defender-se é a manutenção dos velhos e vazios discursos, das desgastadas querelas partidárias e pessoais, com contornos de opereta, impedindo um discurso novo de gente diferente que aparece pela primeira vez.

Este objectivo dos media traduz-se numa espécie de sucessão mediática.

Vejamos: Começam por cobrir de forma exagerada as Universidades de Verão promovidas pelos partidos; subentendem que aqui uma nova geração se prepara para governar; que aqui se renovam as juventudes partidárias, destas escolhem alguns que começam a aparecer nos comentários televisivos e finalmente aí estão a governar-nos da forma que conhecemos e com a qualidade que os nossos indicadores nacionais revelam.

Reconheçam o mau investimento que fizeram nesta gente e tentem diversificar!

Reconheçam o que acontece com os Movimentos da Sociedade Civil que sem meios fazem o que os partidos desprezam, ou seja, acordar as pessoas para a participação, para a intervenção cívica, para uma auditoria construtiva á execução pelo poder político.

Valorizem que o melhor que temos, e por onde passa o futuro de Portugal, são mesmo os portugueses, cujo potencial os Políticos mais do que ignorar, esmagam!

A actividade voluntária e voluntarista de uma Cidadania Activa não passa nos media e cria-se até a ideia de que a Sociedade Civil em Portugal não existe ou é amorfa.

É essa Sociedade e dela, esses Candidatos verdadeiramente independentes e que nos querem acordar do sono partidário que vivemos, que os media querem considerar cidadãos de segunda!

Nisto os objectivos dos media estão em sintonia com os dos grandes partidos.

O debate sobre as eleições autárquicas decorre do que os dois líderes dos maiores partidos estabeleceram, ou seja, uma câmara a mais ou um voto a mais, na contagem nacional.

A eleição autárquica, aquela que deveria ser a mais importante pela proximidade aos cidadãos, transforma-se num “faz de conta”.

Nesta farsa de democracia, melhor é mesmo o silêncio, talvez ele nos possa dizer mais do que a pobreza da campanha que se preparava.

Talvez o silêncio nos obrigue a pensar na incoerência do momento que vivemos.

Não tenhamos ilusões, um outro silêncio tem crescido, estendendo-se às legislativas e às presidenciais, isto é, o silêncio da abstenção!

O peso desse silêncio, que não tem sido reconhecido, é o sintoma mais grave do divórcio entre governados e governantes.

O peso desse silêncio é o sintoma mais grave de que a Democracia pode fugir…!

6 comentários:

  1. A abstenção não é SILÊNCIO, é COMODIDADE E COBARDIA.

    SILÊNCIO É IR LÁ VOTAR EM BRANCO.

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  2. Não faz sentido estar a pedir RESPONSABILIDADE a quem depois se LEGITIMA COM O VOTO.

    O VOTO é uma ARMA, em vez de o desvalorizarem USEM-NO, no sentido de permitir a renovação da própria democracia representativa.

    Sem essa renovação é a própria Democracia como um todo que está posta em causa.

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  3. O país está mal e com estes movimentozecos da treta como o pasc só ficaria pior. Só escrevem idiotas aqui!

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  4. Carlos Miguel Sousa: em Portugal, o voto não é a "arma do povo" e o Carlos sabe porquê. Quando se conquistou o "voto", a maioria achou que era uma coisa extraordinária porque o comparou com o que tinha no regime anterior. Só que agora o povo quer mais, compara com os restantes países europeus e a comparação não sai favorável. Alguns países têm círculos uninominais, outros têm um sistema de listas como o nosso, mas nos quais a ordem pela qual os lugares de deputado são atribuídas aos membros da lista é em função de quem tem mais votos. Mesmo nos sistemas de listas, há sempre um voto nominal, numa pessoa concreta. Não se vê em muitos países esta prática autoritária dos partidos imporem a ordem das listas ao eleitorado.
    Jorge Tavares

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  5. Inteiramente de acordo com a ideia de votar branco em vez de não ir votar. Quanto à comunicação social (CS), concordo com o sugerido no artigo: a comunicação social, ao tratar como "pequenos" os partidos recentemente constituídos, está na prática a condená-los ao papel de pequenos, sem que estes tenham tido a sua oportunidade de testar as suas ideias perante o eleitorado. Ao proceder assim, a CS está de facto a fazer o jogo da partidocracia e a falhar no seu papel de pilar da democracia.

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