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quinta-feira, 11 de dezembro de 2014

CRESCIMENTO ECONÓMICO: DIVERSIFICAR O MODELO DE FINANCIAMENTO DAS PME: Conferência CIP · Intervenção de António Saraiva, Presidente da CIP, na Sessão de Abertura · 28 de Novembro de 2014.


Maria Perpétua Rocha, Coordenadora da PASC - Plataforma de Associações da Sociedade Civil - Casa da Cidadania, participou na Conferência "Crescimento Económico: Diversificar o Modelo de Financiamento das PMEs", organizada pela CIP - Confederação Empresarial de Portugal. Ao longo dos últimos anos, a CIP tem apoiado a PASC, considerando-a como sua Parceira. Pela relevância do tema desta iniciativa para as PME, pilares da economia portuguesa, transcrevemos o discurso de Abertura de António Saraiva, Presidente da CIP.

 




Senhor Ministro da Economia,
Senhores Oradores nesta Conferência,
Senhores Participantes,
Minhas Senhoras e Meus Senhores,




Quero começar por agradecer a presença de todos nesta Conferência da CIP sobre a diversificação do modelo de financiamento das empresas.

A vossa presença e, em especial, a participação de empresas nesta Conferência é, para a CIP, um motivo de grande satisfação, que expressa a importância do tema e a oportunidade da sua discussão.

Poderíamos ser mais os que aqui estamos presentes, mas estou confiante que os debates que vamos desenvolver sejam muito alargados e bastante participados. Estou certo que todos vão olhar para as conclusões desses debates com atenção e com interesse em ultrapassar os problemas de financiamento que afetam o crescimento económico e a manutenção do emprego.

Queria também agradecer a presença de membros do Governo – o Senhor Ministro da Economia, nesta Sessão de Abertura, e o Senhor Secretário de Estado das Finanças, em representação da Senhora Ministra de Estado e das Finanças, na Sessão de Encerramento.

Queria ainda agradecer aos parceiros da CIP nesta Conferência, inserida no quadro da Semana Europeia das PME - a Deloitte, a Euronext e o Diário Económico.

Queria, por fim, agradecer ao Engº José António Barros e ao Dr. João Costa Pinto o trabalho que desenvolveram na escolha do tema e na preparação da Conferência.

E não queria também deixar de referir o trabalho desenvolvido pelos serviços da CIP, que foi muito importante e contribuiu para a organização dos trabalhos desta Conferência sobre a diversificação do modelo de financiamento das PME.

Minhas Senhoras e meus Senhores,

Desde 2010, verificam-se em Portugal estrangulamentos nos fluxos normais de financiamento das empresas, com particular incidência sobre a generalidade das Pequenas e Médias Empresas.

Este problema constitui um sério constrangimento ao relançamento do investimento, à criação de emprego e à desejável mudança estrutural da Economia Portuguesa, que pressupõe a competitividade das nossas empresas no mercado global.

Desde 2010, e particularmente a partir do início do Programa de Ajustamento Económico e Financeiro, a CIP tem dado particular prioridade à resolução deste problema.

Ao longo dos últimos anos, temos vindo a alertar para as suas implicações e para a necessidade de inverter uma situação que aprofundou a recessão e levou à destruição de empresas, de emprego e de capacidade produtiva.

Alertámos para o facto de as necessidades de financiamento do setor público empresarial não terem sido devidamente equacionadas no Programa de Ajustamento e das consequências que isso teria sobre o financiamento da economia como um todo.

Criticámos, junto da troika e junto do Governo, o ritmo excessivo a que se processou a desalavancagem do setor financeiro.

Defendemos que os recursos e instrumentos do Grupo formado em torno da Caixa Geral de Depósitos deveriam ser focados no apoio às PME, o que contribuiria fortemente para reorientar o mercado bancário.

Chamámos a atenção para a prioridade a dar à recapitalização das empresas, por forma a garantir a sua capacidade de investimento e permitir também uma melhor avaliação de risco por parte da Banca, possibilitando o acesso ao crédito em melhores condições de pricing e prazos de reembolso.

Muitas vezes repeti que a recapitalização das empresas é tanto ou mais urgente e fundamental quanto a recapitalização da banca.

Defendemos, por isso, a criação de condições necessárias para o reforço dos capitais próprios ou permanentes das empresas, através da efetiva operacionalização de instrumentos de capital de risco, de “quase capital” e de conversão de suprimentos ou outros créditos em capital próprio.

Apresentámos propostas nesse sentido.

Defendemos ainda a articulação entre a questão do financiamento das empresas e a fiscalidade, através de medidas fiscais de modo a induzir o reinvestimento de resultados e o fortalecimento dos fundos próprios das empresas.

Insistimos (e continuaremos a insistir) na responsabilidade do Estado liquidar os seus pagamentos às empresas a tempo e horas e a de acionar mecanismos que permitam a regularização das dívidas a fornecedores por parte dos hospitais, autarquias locais e regiões autónomas.

Queremos ir mais longe na nossa reflexão em torno do problema do financiamento e alargar e fundamentar a nossa intervenção neste domínio.

Constatamos hoje que o modelo tradicional de financiamento se encontra fortemente comprometido, dada a reorganização em curso do mercado bancário e a recentragem do modelo de negócio bancário.

Contudo, mantém-se uma forte dependência das empresas relativamente ao crédito bancário.

Por outro lado, constatamos também a existência de liquidez disponível nos investidores institucionais.

É preciso mobilizar esta liquidez para o financiamento do investimento privado.
Esta preocupação está também presente a nível europeu. O plano de investimento agora apresentado pela Comissão Europeia vai precisamente nesse sentido.

Torna-se necessário que, para além do financiamento bancário – que, apesar da complexidade atual, permanecerá como uma importante fonte de financiamento – sejam desenvolvidos e implantados novos mecanismos especializados no financiamento das PME:

  • Novos tipos de intermediários especializados;
  • Novos produtos e instrumentos de financiamento de PME.

Estas novas fontes de financiamento deverão, de forma progressiva, ganhar peso, articulando-se com as formas mais tradicionais de crédito bancário.

Algumas das novas fontes de financiamento, tais como os Fundos Especializados, podem dar um contributo importante para um movimento de modernização do nosso tecido produtivo.

Para acelerar, reforçar e dar solidez a este movimento é preciso articular as formas mais tradicionais de financiamento com o recurso ao Mercado de Capitais e à ação de novos intermediários financeiros.

É preciso também dotarmo-nos de um adequado quadro fiscal, jurídico-administrativo, de regulação e operacional, para além da utilização corrente de técnicas de rating e de scoring que permitam atrair ao Mercado Especializado no financiamento de PME novos investidores nacionais e estrangeiros.

Para avaliar e discutir estas questões – que assumem uma importância crítica, tanto pela situação doméstica, como pela evolução dos mercados bancários europeus, a caminho da implantação da União Bancária – a CIP tomou a decisão de realizar esta Conferência, reunindo: Reguladores, Bancos, Especialistas do Mercado de Capitais, da Garantia Mútua, dos Fundos Especializados e Fiscalistas, assim como Empresários representando diferentes tipos de PME. O objetivo dos nossos trabalhos é chegar a um conjunto de conclusões e propostas sobre estas questões, a dirigir ao Governo.

Muito obrigado e bom trabalho.

Lisboa, 28 de novembro de 2014.

quarta-feira, 4 de junho de 2014

PORTUGAL E A EUROPA: um artigo de Joaquim Moreira.


por Joaquim Moreira (Este texto representa apenas o ponto de vista do autor, não da PASC, nem das associações que a compõem).



Deixando as elaborações “profundas” político-económicas ou de cariz histórico-filosófico para os especialistas do nosso burgo, gostaria de fazer algumas reflexões, que considero terem interesse na avaliação serena desta relação: Portugal e a Europa.


A adesão à UE - União Europeia


Sendo importante conhecer o que aconteceu desde a criação da Comunidade Europeia do Carvão e do Aço (CECA), passando pela Comunidade Económica Europeia (CEE), até à atual União Europeia (UE), para entendermos como e porque aderimos à CEE, convém desde logo referir que se tratava de uma inevitabilidade, depois da queda do Estado Novo e do compromisso com um dos desígnios da Terceira República, o terceiro “D” - Desenvolver. Sem prejuízo de outras leituras, os políticos viram nos Fundos de Coesão a forma de se perpetuarem no poder, com ou sem alternância, de tal forma que não viram nenhum interesse em perguntar aos seus cidadãos se também estavam ou não interessados no “negócio”. Confesso que não sei se teria havido alguma alteração ao facto consumado. Não acredito que fôssemos capazes de dizer sim ou não, com base em conhecimento e avaliação das vantagens e dos inconvenientes, penso mesmo que nem os decisores.


A adesão ao Euro


Apesar do longo período da construção europeia, que continua, entrámos e, passado muito pouco tempo (treze anos), aderimos ao Euro. Mais uma vez sem nos perguntarem nada. Não me lembro das elites se revoltarem, apenas de alguns “cépticos” do costume se manifestarem. Curiosamente, muitos dos que se manifestam hoje contra o Euro - nem todos a favor do Escudo - ganharam bastante com a passagem do Escudo para o Euro. Parece óbvio que não preparámos a nossa economia - fraca para ter uma moeda forte - da mesma forma que me parece óbvio que, depois do esforço que já foi feito pelas empresas e pelas famílias - a maioria dos portugueses - só temos um caminho a seguir: em frente. A nossa história comprova que esse é o nosso caminho, não vacilar em momentos difíceis. Não é esta Europa, muito menos o Euro, que nos vai impedir de nos afirmarmos e desenvolvermos, como um parceiro pleno de direitos e de deveres.


O Conceito Estratégico Nacional


Não havendo, como nunca houve, um Conceito Estratégico Nacional (CEN) escrito, temos usado o Conceito Estratégico de Defesa Nacional (CEDN), que de algum modo infere o CEN. Recentemente, vinte e seis eminentes personalidades, entre as quais algumas por quem tenho grande respeito e consideração, elaboraram e propuseram um novo Conceito Estratégico de Segurança e Defesa Nacional (CESDN), posteriormente aprovado, com algumas alterações e o desacordo dos proponentes, pelo Governo e pela Assembleia da República, com a designação de CEDN, como no anterior conceito de 2003. Foi com muita surpresa e alguma estupefação que constatei que a proposta apresentada para o CESDN ignora a nossa adesão à UE e ao Euro. O anterior CEDN teve, pelo menos, o cuidado de fazer referência a estas duas realidades, agravadas pela recente assistência financeira internacional. Com todo o respeito pelos autores, tenho muita dificuldade em entender que se elabore, para dez anos, um qualquer CEDN, que não tenha em conta estas duas realidades.


A solidariedade Europeia


Quando ouvimos falar de solidariedade europeia, parece que esta só tem um sentido. A solidariedade europeia deverá ter sempre dois sentidos. É, para mim, difícil de compreender que se ajude um amigo em dificuldades e ao mesmo tempo o nosso amigo não se prive das extravagâncias que o levaram a essa situação. E não me venham com o argumento de que um país não é uma empresa, uma família, ou muito menos um amigo. Nesta comunidade de nações teremos todos que ser solidários, uns e outros. Não deve haver distinção entre ricos e pobres, terá que haver apenas, e só, parceiros que cumprem as regras que livremente decidiram aceitar. Será que já nos esquecemos dos muitos milhares de milhões de euros que recebemos de Fundos Europeus, alguns a fundo perdido? Se isto não é solidariedade, continuamos pobres e mal agradecidos. O que demos em troca: muito dinheiro mal aplicado, que não contribuiu para a coesão pretendida e razão da solidariedade de que tanto se fala. Queremos mais, mas não queremos dar nada em troca. Nem algumas limitações inevitáveis de soberania, como é o caso do controlo da moeda e das contas públicas, com vantagem para quem não gosta de ser enganado. (Por exemplo, no caso da moeda própria, como acontece quando os governantes a desvalorizam. Empobrecemos, mas não parece, porque apesar de se aumentarem os vencimentos a funcionários públicos e, por sua vez, as empresas os salários dos seus trabalhadores, ficamos com mais dinheiro no bolso, mas com menos poder de compra. Enganados, mas “felizes”.)


Uma Europa de Estados-Nação


Sendo a União Europeia um conjunto de nações, algumas com milhares de anos de História, fácil será compreender a dificuldade da sua construção. Difícil será atingir o Federalismo quando ainda existem muitos problemas de Nacionalismos em nações que aceitaram pertencer a esta União. Não consigo compreender os que acham que, sem resolver ou ajudar a resolver problemas “comezinhos” - como são as questões de igualdade de condições de concorrência interna, as taxas sobre as empresas e os custos do dinheiro - partem logo para a defesa de um Governo Federal que, a acontecer, terá que ser o resultado de um esforço colectivo das nações e das suas gentes e não, mais uma vez, o resultado de decisões das tais “elites” iluminadas. Julgo haver vantagem em que a construção da Europa se faça à velocidade a que as pessoas sejam capazes de compreender os seus governantes e estes a capacidade para os convencerem do interesse em serem membros de uma União Europeia que, no século XXI, se pretende forte, porque culta, rica e solidária, interna e externamente. Uma Europa onde se continue a viver em paz e com qualidade de vida.


A dimensão variável da União Europeia


Criar um Governo Federal numa União Europeia que ainda não conhece as suas fronteiras - continua a haver países a pedir a sua adesão e outros a equacionar a sua saída - não me parece uma visão inteligente, o que não significa que a situação atual seja a solução ideal. É a solução possível, se considerarmos que uma qualquer decisão pressupõe a concordância de muitos e diferentes povos, social, cultural e economicamente. A criação do novo “Estado-Nação”, qualquer que seja o seu modo de governança, será sempre um processo lento, se quisermos que seja consistente e duradouro. Os erros do passado, se apreendidos, poderão ser uma vantagem para evitar sacrifícios ou dificuldades no presente. Deve-se pois evitar que a UE cresça à custa de novos membros, sem que estes antes conheçam as vantagens e os inconvenientes da sua entrada, preparando-se adequadamente. O facto de, apesar de já sermos vinte e oito, continuar a haver candidatos, deve dizer-nos algo sobre a importância do Projeto Europeu, mas também sobre a dificuldade de gerir a sua dimensão, ainda para mais variável.


A Governação da União Europeia


Por tudo isto, considero que a solução atual, com o Parlamento, a Comissão, o Conselho, o Banco Central Europeu e o Tribunal Europeu, sendo de difícil governo, se adequa à dificuldade que é e continuará a ser a construção europeia, sem prejuízo de constantes melhoramentos. Espero assim que, com avanços e recuos, seja possível continuar este projeto, que tem todas as características para ter sucesso, ao contrário do que dizem os ainda “velhos do Restelo”. Mais do que homenagear os fundadores, que sejamos capazes de dar o nosso melhor para que as futuras gerações possam viver numa Europa onde continue a ser bom viver e um exemplo de convivência e prosperidade num Mundo com problemas sociais e humanos de dimensão tal que nos deve encorajar a prosseguir.


Algumas interrogações finais


Enquanto fazia esta reflexão, decorria a campanha para as eleições europeias, que se realizaram no Domingo, dia 25 de Maio. Depois de ouvir alguns comentários, com expressões do tipo: “um terramoto”, “uma catástrofe”, “um caos”, ocorreu-me a pergunta: mas em democracia a voz do povo não é soberana? Ou será que só há democracia quando os outros estão de acordo connosco? Em democracia, o problema é outro: como governar com opiniões tão diferentes? Tudo isto, conduz-me a outra reflexão: os críticos do “Governo Europeu” da União de que falava no parágrafo anterior, por um lado lamentam-se dos resultados da consulta democrática, por outro também se lamentam da falta de democracia; situação, aliás, semelhante à daqueles que apoiam as decisões do Tribunal Constitucional, órgão “não democrático”, contra as decisões de outros órgãos de soberania resultantes de eleições democráticas. Será que os que rejeitam o Projeto Europeu ainda têm saudades do tempo, agora fora de tempo, do “orgulhosamente sós”?

Uma última nota: Apareceu “nas bancas”, na última semana de Maio,  um novo jornal só electrónico, cuja qualidade me anima bastante. Com este jornalismo “explicativo”, acredito numa melhor cidadania futura, desde logo porque pode ajudar à qualidade das nossas elites.

terça-feira, 27 de maio de 2014

AFINAL PERDEMOS TODOS: um artigo de Jorge Marques.

por Jorge Marques (Este texto representa apenas o ponto de vista do autor, não da PASC, nem das associações que a compõem).



Não é completamente despropositado falar-se de vitórias que são derrotas e vice-versa. Isso acontece em vários sectores e momentos da nossa vida. Podemos começar com um exemplo bem popular e que diz respeito ao futebol, ocorre numa eliminatória a duas mãos e quando no segundo jogo a vitória não é suficiente; acontece no mundo empresarial quando a vitória foi tão cara que colocou em risco a empresa; acontece, em geral, na nossa vida quando para se ganhar se perdem valores importantes.

Por isso, não temos que nos espantar com as vitórias/derrotas desta eleição europeia, a começar pelo desvirtuamento do objectivo para que foi realizada, isto é, seria suposto que a Europa ganhasse, mas afinal ninguém lhe passou cartão e acabou por perder. Estas eleições nunca foram europeias, desde o primeiro minuto de jogo.

A curiosidade destas eleições é que foram tornadas públicas pelos media várias leituras, provavelmente todos terão razão, ou pelo menos a sua razão, mas essa opinião mediática foi feita pela mesma gente de sempre, pelos próprios actores ou seus agentes. Nada se ficou a saber sobre o que pensa a grande maioria do povo português, dos eleitores, o que quer dizer que os cidadãos, a sociedade civil, continua sem voz e sem representação e nem mesmo a sua deliberada mudez lhe é reconhecida.

Assistimos, como durante a campanha, a uma combinação de frases sem sentido, manipulação de opiniões, tentativa de calar, iludir e nada concluir da nossa doença democrática. Quiseram reduzir a democracia ao voto, agora o voto já não quer ser mais figurante, não perceberam que votar era o princípio de uma relação e não o fim.

A não ser Marinho Pinto, ninguém ganhou nestas eleições, nem os partidos políticos representados na Assembleia, nem o Presidente da República, nem o país, nem os cidadãos, nem a Europa.

Já sabíamos que o nosso sistema político-partidário que nos representa tem um número de militantes de cerca de 3% dos eleitores, agora ficámos a saber que na nossa Assembleia da República apenas estão representados, de facto, pouco mais do que 25% dos eleitores. Afinal quem representa os outros 75%? Bem podia ser o Presidente da República que é eleito directamente pelo povo, só que também não o é, acaba por ser eleito com o apoio e os meios dos partidos que o apoiam e nem sequer disfarça, também ele está nestas eleições e representa agora apenas, de facto, 10% dos eleitores. Quem é o Presidente dos outros 90%?

Os portugueses estão abandonados no seu próprio país. Entre os que não votaram, os brancos e os nulos estão praticamente 75% dos portugueses. Os portugueses emigrados, a diáspora, estão a ainda mais abandonados, não votaram 98,2%.

O nosso sistema político, como muita gente vinha avisando, tornou-se um sistema fechado e por isso a entropia, a corrupção e os interesses vários afastaram-no dos seus representados. Está aí a fotografia da situação e não falem agora de europeias no final do jogo, esta é a imagem do sistema.

A regeneração do sistema político faz-se como as células do corpo humano, substituem-se ciclicamente, e mesmo os neurónios do cérebro, que se pensava que não eram substituídos, sabe-se agora que se vão modificando com a aprendizagem e na relação com todos os outros. É essa a nossa natureza enquanto Sociedade Civil Viva…querer que o cérebro aprenda, mude e se relacione com todos nós…

quinta-feira, 13 de março de 2014

BLOQUEIO DEMOCRÁTICO: um artigo de Rui Martins.

 

por Rui Martins (Este texto representa apenas o ponto de vista do autor, não da PASC, nem das associações que a compõem).



No sistema Democrático Representativo em que vivemos, a Democracia já não pode ser entendida como "o governo dos cidadãos pelos cidadãos". Neste atual regime, as elites - como sob o Antigo Regime - ainda governam. Travestiram-se de panos mais alegres e populares, mas continuam a ser uma clique fechada, que se cruza entre si e que se crê geneticamente superior às massas ignorantes e bovinamente dóceis que governa.

Neste sistema democrático que nos rege, as elites políticas, uma vez eleitas e elevadas até posições de poder, assumem-no e guardam-no ciosamente para si. Em nome dos cidadãos que os elegeram, claro, mas sem a sua participação. Nos partidos, os barões dos aparelhos profissionalizados são mais importantes que os militantes de base que, supostamente, representam. Acima destes barões, os líderes do partidos, afastam-se radicalmente dos militantes e aproximam-se dos barões, tornando-se a sua capacidade de controlo desta máquina partidária cada vez mais essencial à sua sobrevivência.

Atualmente, e um pouco por todo o mundo dito "desenvolvido", observa-se um recuo dos níveis de qualidade da participação dos cidadãos na democracia. Por exemplo, numa das democracia mais desenvolvidas da Europa, o Reino Unido, em 1950, 84% dos cidadãos participavam regularmente nos atos eleitorais. Em 2010, essa média tinha caído para 59%. Nos países da OCDE, a participação média dos cidadãos nas eleições caiu 11% entre 1980 e 2011. De forma paralela, e nos países onde existem essas estatísticas (como no Reino Unido), os níveis de desigualdade política subiram em flecha, com participações de apenas 57% nas classes económicas mais desfavorecidas, um valor que tem que ser comparado com os 76% de participação eleitoral nos escalões mais abastados da sociedade britânica.

Os baixos níveis de participação eleitoral dos cidadãos são acompanhados no mesmo ritmo descendente pelo declínio das massas de militantes dos partidos políticos. Onde antes existiam partidos com centenas de milhares de militantes, em França, Espanha ou Itália, temos hoje partidos que funcionam numa lógica de aparelho profissional e com algumas dezenas de milhares de militantes realmente ativos e empenhados, e mesmo assim, quase todos ligados ou dependentes de cargos na Administração Pública ou de nomeação política. Este esvaziamento dos partidos convencionais estimula ao desenvolvimento dos "populismos", de direita (na Europa) ou de Esquerda (na América Latina), levando a que os políticos dos partidos representativos convencionais se tenham tornado em líderes do vácuo, ou na expressão de Peter Mair "senhores do vazio".

Esta perda de representatividade dos partidos é global e está muito longe de ser apenas um fenómeno europeu ou sul americano. Assenta no cruzamento de dois factores: de um lado, os partidos deixaram de ser capazes de representar os interesses das populações, já não são eficazes na resposta às suas necessidades e não são percepcionados como formas adequadas de representação política. Atualmente, os partidos políticos são principalmente um elo de ligação entre o Estado e o Cidadão, na melhor das hipóteses, ou, na pior, entre grupos de interesses e o Estado.

Mas não é só dos cidadãos que os partidos representativos convencionais estão mais distantes. É também dos seus próprios militantes... A política de austeridade dogmática e cega, a fidelidade mais ou menos canina aos grandes interesses económicos e financeiros e a subalternização do poder democrático nacional a entidades supranacionais, como a Comissão Europeia ou o BCE, desgastaram a capacidade de influência dos militantes na condução da política dos seus próprios partidos. A quebra sistemática de promessas eleitorais (comum em Portugal, mas com um recente apogeu com Hollande, em França) deu uma machadada final nesta ligação entre militantes e direções partidárias... Longe dos cidadãos, afastados dos militantes, as direções partidárias funcionam em roda livre, fiéis apenas ao seus regentes estrangeiros ou ao anonimato dos mercados e da Alta Finança.

Esta grave e irreversível crise de representatividade dos partidos políticos convencionais abre a porta a todo o tipo de riscos à democracia. Desde logo, pode ser (e é) explorado por todos os populismos extremistas, com a sua aparente capacidade para apresentarem soluções imediatas e simplistas para problemas complexos. Usando a incapacidade crescente por parte de muitos cidadãos para - por falta de tempo, disponibilidade mental e preparação intelectual - pensarem "lento" em assuntos complexos, formando assim a sua própria opinião, em vez de a comprarem "chave na mão" a "fazedores de opinião" profissionais, os cidadãos abrem-se a populismos e extremismos vários.

Os partidos políticos convencionais estão preocupados com a ascensão destes populismos na Europa... e estão a responder com uma hiper-simplificação do seu discurso quer para recuperar esse eleitorado, perdido para os extremismos, quer para alimentar a voracidade insaciável dos meios de comunicação. Isto significa, contudo, que se afastam cada vez mais da realidade e se aproximam de forma crescente da insatisfação crónica das suas promessas. Paralelamente, nas raras promessas que conseguem efetivamente concretizar, evitam soluções profundas ou de longo prazo, concentrando-se no curto e, sobretudo, no horizonte curto das próximas eleições. A pequena política domina assim a grande política, o caso mediático esmaga a abordagem de fundo e o populismo vence a política...

Este fenómeno de avanço da pequena política e de recuo dos cidadãos nos assuntos da democracia levou a que o espaço político esteja hoje ocupado principalmente por políticos profissionais e pelas elites familiares e do poder económico que nesse espaço vivem e de onde retiram uma parte substancial dos seus rendimentos. As corporações, os lobbies e os tráficos de influência encontram neste terreno pantanoso campo fértil para se desenvolverem.

Este afastamento dos cidadãos da política e dos partidos políticos, e recuo do espaço da cidadania ativa, explica a facilidade com que os interesses económicos invadiram o espaço da governação. O Estado, tradicionalmente o ponto de equilíbrio entre os Grandes Interesses e os Cidadãos, inclinou-se claramente na direcção dos primeiros. Este processo começou com a ascensão do neoliberalismo e da desregulação do setor financeiro e do comércio internacional, e acentuou-se com a financeirização da economia, as deslocalizações, a desindustrialização, os altos níveis de desemprego e o recuo sistemático do Estado Social em praticamente todo o mundo desenvolvido.

O Estado Social está, além do mais, sob grande pressão: a base fiscal necessária para o suportar diminui ano após ano, à medida que o desemprego crónico aumenta, os salários médios caem de forma sustentada e o capital se torna cada vez mais móvel e fugidio e os Estados se empenham numa concorrência fiscal desenfreada. Pressionado nas duas frentes da redução de recursos e da privatização dos serviços, o Estado Social perde dimensão. A aplicação de camadas sucessivas de austeridade é - para os políticos da Situação - a forma mais rápida "ajustar" as despesas aos rendimentos do sistema. Em consequência, a política perde influência junto dos cidadãos, que percepcionam (não sem razão) todos os partidos como iguais nessa estratégia de compressão sistemática do Estado Social, visto como o braço principal do Estado e da própria Democracia junto do cidadão.

Esta desilusão generalizada para com a política leva a que muitos pensem como o politólogo alemão Wolfgang Streeck que acredita que a Democracia e o Capitalismo já não são compatíveis e que os cidadãos deixaram de votar por uma boa razão: porque já não acreditam que haja nada que os políticos possam fazer por eles...

Contudo, este bloqueio democrático tem saída: formas de auto-governo local participativo, partidos políticos de um novo tipo, mais abertos aos cidadãos e aos seus próprios militantes, um novo papel, em capacidade e simplicidade, para as formas já atualmente existentes de democracia direta no atual modelo representativo, como as petições, os referendos e as iniciativas legislativas de cidadãos. Todas são respostas possíveis ao atual bloqueio democrático e estão disponíveis... assim queiramos aproveitar esta disponibilidade.

segunda-feira, 10 de março de 2014

DO BLOQUEIO DA SOCIEDADE CIVIL EM PORTUGAL: um artigo de Rui Martins.

 

por Rui Martins (Este texto representa apenas o ponto de vista do autor, não da PASC, nem das associações que a compõem).



1 · Existe atualmente um notório bloqueio da Sociedade Civil em Portugal: uma grande percentagem dos cidadãos abstêm-se de uma vida cívica, associativa ou política e, até, do simples acto de votar. Este abismo entre eleitos e eleitores não cessa de se aprofundar através da labuta incansável da escavadora da abstenção eleitoral e cívica. Este abismo encontra várias explicações na matriz sócio-cultural do povo português, mas as razões mais poderosas são a inexistência de alternativas credíveis de governação e a baixa densidade da rede associativa em Portugal. Os dois fenómenos são manifestações desta mesma causa: o abstencionismo crónico do português. 

2 · Faltam alternativas políticas credíveis: os partidos da Situação (também ditos "do arco da governação") alternam-se rotativamente no governo, partilhando prebendas e jobs for the boys e incumprindo programas eleitorais uns atrás dos outros. A oposição à esquerda, mantém discursos demagógicos, anacrónicos e extremados, sem ligação com a realidade e sem aparente vontade de se assumir como real e credível alternativa de poder. Faltam verdadeiras alternativas, capazes de se oporem de forma consistente às perdas sucessivas de soberania, impostas a partir do norte da Europa e a um servilismo bacoco pelos Grandes Interesses económicos e financeiros que colocaram os Partidos da Situação de joelhos. Falta uma alternativa que seja Participativa por dentro e por fora, avessa a protagonismos, lobbies internos ou derivas autoritárias e permanente aberta aos cidadãos, às suas contribuições e opiniões. Falta um novo partido que recentre a Democracia na Participação dos cidadãos e a afaste desta atual lógica Representativa, condicionada, servil e aparente, da nossa Partidocracia. 

3 · Faltam associações cívicas e políticas não partidárias. A esmagadora maioria das associações portuguesas são de fim "recreativo". Isto é, assumem como missão principal a organização e execução de festas e bailaricos. Nada temos contra a "festa" ou o aspecto lúdico da vida, mas a inexistência de associações cívicas fortes e numerosas é um reflexo do recuo do cidadãos da condução ativa, vigilante ou interveniente na vida da sua comunidade local e nos destinos do seu país. Causas que propelem os cidadãos a organizarem-se, de forma formal em associações, ou informal em movimentos cívicos, não faltam. Faltam é cidadãos que estejam dispostos a nelas militarem, defendendo sem Medo ou pudor aquilo em que acreditam. Esta carestia de cidadãos ativos é, sem dúvida, a maior doença da nossa Sociedade Civil. Os que se mexem, que se preocupam, que fazem, são raros e geralmente estão presentes em várias causas... ou seja, estão assoberbados.

segunda-feira, 24 de fevereiro de 2014

A NECESSIDADE DE UM CONCEITO ESTRATÉGICO NACIONAL QUE ULTRAPASSE OS CICLOS ELEITORAIS: um artigo de José Eduardo Garcia Leandro.


por José Eduardo Garcia Leandro (Este texto representa apenas o ponto de vista do autor, não da PASC, nem das associações que a compõem).



ABORDAGEM CONCEPTUAL


Tudo está relacionado com a necessidade de um projecto colectivo, tanto para uma empresa como para um país.

Numa empresa chama-se normalmente o projecto de estratégia de longo prazo, enquanto que num Estado se designa (ou deveria designar-se) como Conceito Estratégico Nacional (CEN), o que, tendo o mesmo objectivo, num Estado é claramente multidisciplinar, muito mais complexo e difícil, já que envolve todas as actividades da sociedade e as do país como um todo.

Porém, qualquer que seja a abordagem, não há nenhum caso de sucesso em empresas ou países se não existir uma estratégia com objetivos (ou um CEN), racionalmente construída, devidamente dirigida e diariamente executada, acompanhada e corrigida (o que é, quase sempre, necessário); em qualquer situação, não se pode é navegar à vista, pois, fatalmente, o desastre será inevitável.

O que é, então, preciso fazer?

Antes de mais, como premissa, para que tal aconteça, é necessário preparar dirigentes competentes, nomeadamente na geopolítica e na história, na prospectiva e no conhecimento do Estado, tendo do antecedente alguma experiência de gestão; doutro modo será apenas uma perigosa brincadeira voluntarista, de experiências inconsequentes e normalmente com maus resultados. Há, também, que tudo fazer para a internacionalização de todas as atividades (raros são os países com uma história de contactos internacionais como Portugal, o que nos dá uma especial vocação individual para o novo mundo que já nasceu; os nossos maiores sucessos, tanto a título individual como coletivo, estão nas atividades que se internacionalizaram) e dispor de um sistema judicial que funcione com eficácia e rapidez; para a importância das funções judiciais não há qualquer alternativa, pois são vitais e de sobrevivência.

Se olharmos para o Estado como uma grande empresa, a mais complexa e abrangente de todas em cada país, com actividades pluridisciplinares que nada deixam de fora, teremos de encontrar um método de planeamento e de execução que:

1 · Defina o que se pretende para o País, considerando a sua História, mas também a envolvente externa que actualmente se modifica a uma velocidade sem precedentes, tanto em termos científicos e tecnológicos, como do número de actores (nacionais, internacionais, transnacionais, oficiais e privados, individuais e coletivos) que participam de modo influente nos acontecimentos. Em Setembro de 1999, Kofi Annan, então Secretário-Geral das Nações Unidas, no seu discurso anual à Assembleia Geral, chamou a atenção para que estava a surgir a Soberania do Indivíduo contra a Soberania do Estado; verifica-se como tal se tem concretizado a um ritmo crescente, com um número cada vez maior e  maior intervenção de atores individuais não comprometidos com grupos tradicionais.

Actualmente, as alterações em causa são tão grandes que apenas encontram paralelo nas Revolução Francesa e na I Revolução Industrial, com as consequências conhecidas a que deram lugar. E agora, com um factor nunca existente na História conhecida: as alterações climatéricas são tão rápidas e profundas que se fazem acompanhar pela alteração da própria geografia (o que significa que tanto a nível mundial como nacional é preciso que tal seja acompanhado por especialistas e levado em conta no planeamento político, geopolítico e económico, se se pretender ter um futuro minimamente seguro).

2 · Considere que atravessamos uma crise em que depois do desaparecimento do mundo bipolar, com a queda dos regimes comunistas, sobreviveu como única ideologia, quase sacralizada, a economia de mercado, tendo, os seus teóricos, tentado convencer-nos que o mercado se auto-regulava, o que foi um erro de consequências catastróficas, quase criminosas.

A Igreja Católica, pela voz dos três últimos Papas, tem denunciado os perigos de tal sistema (João Paulo II em 1989: “Se nos regozijamos com a queda do comunismo, nunca poderemos aceitar a chegada do capitalismo selvagem”; Bento XVI chamou-lhe “o perigo do capitalismo financeiro desregulado”; Francisco I disse em 2013 que “o capitalismo financeiro mata”).

A consequência global desta tendência tem sido a da deslocação do Poder Político Eleito para os Controladores (sem rosto) dos Mercados Financeiros, o que aliado à grande evolução tecnológica, privilegia o valor das acções financeiras em detrimento da produção e do trabalho. Tendencialmente, poder-se-ia dizer que o êxito desta doutrina ocorreria quando as máquinas, autómatos e computadores pudessem fazer tudo, sendo os trabalhadores reduzidos ao mínimo; enriqueceriam cada vez mais as empresas de capital e os seus accionistas, ficando para os Estados, cada vez mais exauridos, a responsabilidade de resolver os problemas sociais, para o que não teriam capacidade.

3 · Tenha a consciência de que a Geopolítica reapareceu em força e os Países lutam principalmente pelos seus interesses, mas também com as grandes empresas sem fronteiras, por matérias-primas, tecnologia e mercados, num jogo de xadrez em vários tabuleiros que se confrontam e se sobrepõem entre si, onde têm de escolher as alianças políticas, económicas e de segurança mais convenientes para atingirem os seus fins nacionais; e aqui entra o pensamento estratégico, nunca nos podendo nós esquecer que este é um jogo de vontades inteligentes em oposição, tendo sempre o conflito (mais ou menos aberto) como base;

4 · Saiba que é dentro deste enquadramento global, muito complexo e multifacetado, que cada Nação tem de definir quais os objectivos que quer para a sua máquina de Estado, os seus atributos e serviços a prestar, e o que fica para a iniciativa privada, cada vez menos nacional, sendo de considerar, no caso da União Europeia, o que ficaria à responsabilidade de Bruxelas e dos seus serviços e o que ficaria com as Nações, o que nesse caso aumentaria a complexidade do sistema com a necessidade de termos funcionários qualificados na Comissão Europeia, na qual quase tudo é resolvido; trata-se de um problema com muitas incógnitas e muitas soluções, mas que, segundo alguns teóricos, para haver sucesso, obrigaria  a que pelo menos numa primeira fase:

  • Tivesse lugar uma revisão dos Tratados Europeus num sentido mais federativo, em que, para além do já feito, tal ocorresse também em termos financeiros, monetários e de regulação bancária, indo até à segurança e defesa, concretizando, antes de mais, o já decidido;
  • Que as Constituições Nacionais fossem, em consequência, adaptadas.

Só estas duas questões, indispensáveis dentro desta concepção, obrigariam a que existisse uma vontade colectiva num sentido comum, o que, no actual momento, em que a Europa perde poder e cada Estado pensa mais nos seus próprios interesses de curto prazo do que na construção da grande Europa, me parece muito difícil ou mesmo impossível; mas nunca deve ser dito que há impossíveis... afirma quem tem fé.

5 · Perceba que nos encontramos já, claramente, a viver um novo tipo de guerra em que as Nações não precisam de ser invadidas para serem derrotadas e perderem o controlo das decisões que têm consequências na vida dos seus cidadãos e no seu futuro. O perigo está muito mais ligado a questões económicas e de perda de soberania (autonomia de decisão) do que a questões clássicas de Defesa. Neste campo específico, a questão é mais de uma Segurança Alargada, em que os riscos vêm quer de movimentos transnacionais de todas as origens, quer de revoltas das bases das sociedades nacionais, muito abaladas pelas dificuldades financeiras e sociais com que se confrontam, situações para as quais ainda não se encontrou um paradigma seguro de resposta, ainda que a colaboração entre os diversos Estados tenha vindo a aumentar, quer a nível bilateral, quer no seio das organizações multilaterais.

Se muitas questões e actividades devem passar para a responsabilidade de empresas privadas, cada vez mais globais, os Estados não podem perder o controlo daquilo que se integra no âmbito dos seus Ministérios da Soberania (Negócios Estrangeiros, Defesa Nacional, Administração Interna -com Segurança Interna e Protecção Civil, Justiça e Finanças) mas também de algumas actividades económicas consideradas estratégicas, independentemente da estrutura de Estado que se queira levantar para garantir maior eficiência e eficácia.


O CASO PORTUGUÊS


Portugal atravessa uma das maiores crises da sua História que, se não fôr devidamente resolvida, pode levar ao seu desaparecimento, independentemente do Governo que estiver em funções.

O que nos veio a acontecer é devido a questões estruturais nacionais não resolvidas, à evolução internacional e erros de gestão, quer nacionais, quer internacionais.

O caso português é particularmente difícil devido a questões estruturais como:

  • o acentuar do desiquilíbrio nos parâmetros da dinâmica populacional;
  • envelhecimento da população com uma percentagem excessiva de reformados;
  • o desequilíbrio da ocupação territorial entre a costa e o interior;
  • a excessiva concentração populacional nas maiores cidades;
  • erros no ordenamento territorial, interior e costeiro, com consequências cada vez mais graves, como se verifica nos fogos, nas inundações periódicas e nos efeitos das tempestades do mar;
  • a destruição (e morosa reconstrução) de actividades essenciais como a agricultura, a pesca e parte da indústria;
  • ambiguidades nos Estatutos das Autarquias e Regiões Autónomas, que actuam sem regras e enquadramentos claros, definindo os limites da sua autonomia;
  • banca e empresas descapitalizadas;
  • desemprego permanente, em particular das gerações mais novas, em níveis muito elevados;
  • a estas questões somou-se recentemente, desde 2012, uma nova onda de emigração dos jovens mais bem preparados; será apenas uma  situação transitória?;
  • juntam-se ainda questões comportamentais dos Partidos Políticos que, com o andar dos anos, se transformaram em verdadeiras agências de emprego, onde as questões de paradigma ideológico e ético foram desaparecendo (com excepção do PCP, independentemente de não estar na minha área de pensamento e comportamento);
  • etc, etc. ... 

Na questão partidária, a escolha dos elementos para o Parlamento tem tido como base os diferentes lobbies e interesses do poder financeiro, os das opções locais, os de cariz sindical e os das juventudes partidárias, o que limita muito a visão do interesse nacional e a independência dos que vêm a ser eleitos, muito dependentes das cúpulas dos seus Partidos.

A isto acresce uma corrupção entranhada que tem vindo a ser denunciada de modo cada vez mais aberto e fundamentado, obrigando a uma reacção mais firme e presente da Sociedade Civil (nomeadamente, e de modo indiscutivelmente comprovado, pelo Dr. Paulo de Morais, embora sem qualquer resultado visível) centrando-se aquela no Parlamento e nas relações promíscuas entre os Partidos Políticos e as grandes empresas e os grandes gabinetes de advogados, situação que é já indisfarçável perante os nossos parceiros da União Europeia e nos deixa mal colocados nos rankings da transparência à escala europeia, mas que parece não incomodar a nossa dita classe política.

Há a absoluta necessidade de uma limpeza de todo o sistema e de um entendimento partidário (a dois ou a três), não havendo qualquer Partido que, por si só, tenha possibilidades de formar um Governo com capacidade para fazer face a tanta dificuldade e necessidade de correcção; mas até agora, esta necessidade nacional, que qualquer cidadão não enfeudado partidariamente compreende, não conseguiu ultrapassar, tanto as concepções dogmáticas dos Partidos, como a sua incapacidade de diálogo e de procura de consensos. Ainda que tal venha ser pedido repetidamente pelo atual Chefe de Estado, ou por Ramalho Eanes e Jorge Sampaio, seus antecessores, e pelas figuras de maior peso dos Partidos do Arco Governamental, uma vez que estamos num processo que deve ser encarado como de salvação nacional.

É evidente que são necessárias muitas e profundas reformas, mas que, para terem sucesso e sem criarem instabilidade, obrigam a que:

  • Se saiba bem o que se quer;
  • Exista uma programação definida para, pelo menos, 10 anos;
  • Se conheçam bem os Ministérios, Serviços e Empresas em que se vai actuar;
  • Se utilizem especialistas e se atue de modo coordenado. 

Acontece que, o actual Governo entrou em funções cheio de vontade e dedicação mas com falta de saber sobre a máquina do Estado, considerando que tudo o que havia sido feito estava errado, com a convicção enganada de que conhecia bem os problemas e as suas soluções, o que foi de grande imprudência mas aplicado com grande voluntarismo e arrogância. Havendo questões que têm sido bem tratadas,  outras há que o são de modo desastrado, sujeitas a experiências sucessivas, quase sempre com falta de coordenação. E o Partido maioritário da coligação sempre demonstrou alguma distanciamento e pouca consideração para com o CDS e para com o PS, o maior Partido da oposição, ambos necessários às soluções a implementar para que a atual crise e a perda de autonomia possam ser ultrapassadas.

Isto tem a sua origem no facto de termos estado acorrentados a visões ideológicas bloqueantes e sem capacidade de entendimentos, cujos resultados estão à vista (da Constituição de 1976, que com todas as suas revisões periódicas continua agarrada a uma visão muito estatizante da sociedade, até à atual liderança do PSD que encomendou um projeto de Constituição de puro cariz neoliberal e queria, entre outros, privatizar a Caixa Geral de Depósitos, não percebendo que um Estado pequeno e fraco tem de possuir um instrumento de intervenção no setor financeiro; até o CDS tem uma preocupação social mais forte que o atual PSD, onde a matriz social-democrata se perdeu; o atual PS parece estar ensanduichado entre 1976 e a solução social-democrata, que sempre foi a sua linha de comportamento dominante, e vai navegando de acordo com os ventos e a necessidade de afirmação sem uma linha clara de rumo).

Historicamente, havia uma preocupação social interiorizada, tanto no socialismo democrático, como na social-democracia e na democracia cristã, que a atual liderança do PSD abandonou copiando as teses da direita mais conservadora do Partido Republicano dos EUA, esquecendo-se que a cultura, o tecido económico e social do país não podem ser comparados com o norte-americano, e não percebendo que as massas críticas dos dois são incomparáveis.

Mesmo a necessidade indispensável de prioridade para a iniciativa privada deve envolver novos investimentos e não apenas a venda de ativos nacionais de grande valor ao capital internacional , perdendo-se a capacidade do controlo nacional sobre algumas atividades de interesse estratégico para o país. Mas a governação tem estado sempre agarrada a uma forte opção ideológica (do Primeiro Ministro, com alguma ingenuidade) que domina todas as suas iniciativas e declarações, desconhecendo o país real (a título de exemplo: não podendo ser esquecida a estrutura do Governo, a declaração patética do Primeiro Ministro quando disse que o desemprego não devia ser encarado como uma vergonha ou dificuldade, mas apenas como uma nova oportunidade; a iniciativa desastrada de tentar resolver a Reforma do Estado em dois dias (16/17 de Janeiro de 2013) com independentes, mas cujo objetivo era apenas cortar 4,7 mil milhões de euros na despesa do Estado; as posições contraditórias sobre a TSU, etc., etc....).

Estas e outras questões marcam definitivamente a concepção do atual Governo sobre o Estado, a Administração Pública e as soluções a encontrar, tendo ajudado a criar instabilidade, medo e revolta no País, em vez de fazer o contrário, o que deveria ser o objectivo. Em consequência, tivemos a inqualificável crise do Verão de 2013 que, milagrosamente, o Primeiro Ministro conseguiu segurar, por ter tido a sua melhor atuação no processo de regresso à estabilidade, mas que deixou o País muito abalado. Este confronto entre a tese perigosamente neoliberal (em que o indivíduo pouco conta) do Primeiro Ministro e a concepção da esquerda socialista do PS tem impedido o alcançar de consensos que permitam soluções adequadas à realidade portuguesa.

Ao mesmo tempo e positivamente, o actual Governo fez um grande esforço, através da chamada Comissão Fontoura (do nome do seu Presidente, Prof. Luís Fontoura), para a estruturação de um Conceito Estratégico Nacional o mais abrangente possível, que por questões constitucionais ainda teve de se designar como Conceito Estratégico de Defesa Nacional (CEDN). O entendimento entre o Ministério da Defesa Nacional (MDN) e a Comissão não terá sido perfeito, já que esta apresentou o livro sobre o seu trabalho na Sociedade Histórica da Independência de Portugal a 3 de Junho de 2013, em edição por iniciativa própria, com a presença do Primeiro Ministro, mas sem o titular do MDN. Só mais tarde, através do Instituto de Defesa Nacional, foram publicados todos os textos e intervenções relacionadas com o tema, num processo desenvolvido pelo MDN, o que é de grande utilidade.

De qualquer modo, tendo aquela Comissão apontado honesta e exaustivamente todas as questões a considerar e a corrigir, mesmo as mais incómodas e dolorosas (o que não terá agradado ao Governo), o problema maior vai estar relacionado com a sua implementação, já que há a necessidade de uma opção orientadora para uma Grande Estratégia Nacional vinda do Primeiro Ministro (que, para além do acerto das contas públicas, parece não existir, estar escondida ou estar errada, ou consistir em experiências casuísticas) em moldes tais que as várias acções a desenvolver sejam devidamente coordenadas, não deixando que cada Ministério actue isoladamente sem considerar as consequências que qualquer decisão terá em áreas consigo relacionadas de outros Departamentos do Estado.

Uma questão exemplar, e fácil de compreender por qualquer um, é a distribuição regional dos serviços da Administração Central, com casos concretos de municípios com serviços que foram desaparecendo, cuja lista é muito extensa, ficando as populações progressivamente esvaziadas nas suas ligações locais com o exterior (quartéis, forças de segurança, escolas, hospitais, serviços judiciais, finanças, correios, etc.).

Quando se entra nas áreas a que tenho, de há muito, chamado de Grande Segurança (Negócios Estrangeiros, Defesa, Segurança Interna e Protecção Civil, Justiça) há questões muito preocupantes, algumas das quais novas, mas quase sempre a montante de quem tem responsabilidades no terreno, tais como as que seguem:

  • Todo o tipo de legislação e estruturas deve ser pensado ao nível da responsabilidade geral pelo Estado, dando equilíbrio na área fiscal e judicial, em moldes tais que seja atrativo investir e  seja possível resolver litígios rapidamente;
  • A guerra atual é essencialmente das informações, da economia, dos movimentos sociais de base e das ameaças transnacionais de todas as origens; assim sendo é preciso que:

    • O planeamento das áreas tradicionais da Defesa Nacional, Segurança Interna e Protecção Civil (neste caso, resolvendo definitivamente os arrastados problemas dos Bombeiros) seja feito de modo integrado pela cúpula do Estado, criando estruturas e dispositivos, formando e treinando pessoal, de modo a que se possa actuar, em qualquer situação e em 24 horas, com profissionalismo e de modo coordenado;
    • Sejam criadas as necessárias estruturas no Estado que permitam a protecção dos nossos dados essenciais (a cibersegurança, nova componente da Estratégia Defensiva); 
    • Planear e orçamentar tudo, de modo a que quando se adquire ou constrói qualquer tipo de equipamento, estejam integradas as despesas para operar e manter, bem como as relacionadas com o indispensável treino do pessoal;
    • E, como é evidente, para tudo poder decorrer de modo positivo, será necessário, não só um entendimento multipartidário, mas também que tais programas, pela sua complexidade, tenham um duração independente das eleições legislativas, prolongando-se por períodos médios de 10 anos.

A gravidade desta situação, para que os responsáveis nacionais e internacionais, das grandes multinacionais da banca e seguros nos atiraram, deveria levar os responsáveis nacionais a perceber que estão obrigados a encontrar soluções de entendimento e consenso. Doutro modo, por não estarem à altura das suas responsabilidades, não poderão continuar a manter a confiança dos eleitores. Há já quem pergunte: "Para que servem os Partidos Políticos? Para que serve a Assembleia da República? Para que serve o Governo?"

Assim, se não houver possibilidades de dar cumprimento a estas simples, mas fortes e indiscutíveis regras, o País continuará nesta apagada e vil tristeza por culpa dos que nos têm representado na Assembleia da República e dos que nos têm governado desde 1976, legítimos representantes eleitos, mas que nunca ganharam a legitimidade da competência e dos resultados concretos.

Ficarei muito feliz se os factos demonstrarem que estou errado.

Mas já se vai verificando que, em princípios de 2014, havendo alguns pequenos sinais positivos de recuperação, os responsáveis pelos Partidos Políticos voltam a demonstrar continuarem mais interessados nas querelas e interesses partidários do que no futuro de Portugal e das suas populações. O que pode ser feito por todos nós?

O cepticismo que apresento em relação ao fundamentalismo ideológico, por vezes não assumido, não põe em causa a necessidade de cada Partido dever ter a sua matriz ideológica, mas que apenas tem interesse prático se for adaptado de modo realista à situação nacional; acresce que os nossos Partidos Políticos concebidos numa lógica que remonta à primeira metade do século XX não estão preparados para se confrontar com os problemas deste novo século XXI, pelo que terão de mudar e de se adaptar para sobreviverem e serem úteis a Portugal e aos portugueses.

Tudo isto é muito difícil? Será! 

Por isso mesmo obriga a um envolvimento e esforço maiores de todos, tendo apenas como objetivo o interesse nacional. É só!

Tudo quanto ficou escrito não se aplica a Ministros, Secretários de Estado, Deputados e Autarcas que ao longo dos anos têm feito trabalho de grande qualidade, com dedicação, competência e honestidade, muitas vezes sem tempo para descansar e para as suas famílias, mas que nunca tiveram capacidade de ter influência no funcionamento do sistema que continua dramaticamente enquadrado pelo que ficou escrito.

Lisboa, 30 de Janeiro de 2014.

segunda-feira, 17 de fevereiro de 2014

MIREM OS MIRÓs: um artigo de Renato Epifânio.


por Renato Epifânio (Este texto representa apenas o ponto de vista do autor, não da PASC, nem das associações que a compõem).



Tendo em conta o conhecido enquadramento financeiro em que nos encontramos, devemos discutir quais devem ser as prioridades na nossa política cultural, que pode e deve continuar a existir. Decerto, pode haver uma significativa pluralidade de perspectivas, todas elas legítimas e devidamente fundamentadas. De algo, porém, estou certo. Em caso algum, sobretudo neste contexto, a prioridade deve ser a preservação em território nacional de quase uma centena de quadros de um pintor catalão, por muito importante que ele tenha sido na história da pintura em geral, quando muito do nosso património se encontra, por escassez de recursos, em flagrante degradação.

De resto, era isso, simplesmente, que deveria ser exigido pela nossa dita "oposição": que o resultado da venda dos quadros revertesse para a preservação do nosso património. Mas isso, claro está, seria pedir demais.

quinta-feira, 16 de janeiro de 2014

AINDA SOBRE EUSÉBIO: um artigo de Renato Epifânio.


por Renato Epifânio (Este texto representa apenas o ponto de vista do autor, não da PASC, nem das associações que a compõem).





Não há nenhum outro país europeu que tenha como herói nacional, em breve até com Honra de Panteão Nacional, alguém cujo tom de pele era menos claro.

Bem sei que a “civilizada” Europa gosta muito de proclamar o seu anti-racismo. Mas só um país “bárbaro” como Portugal, que não sente a necessidade de se proclamar anti-racista, poderia tê-lo feito. E isso diz muito sobre Portugal. Muito e bem.

Desde logo por isso, saúdo, pois, a eleição popular do lusófono (porque não apenas português e/ou moçambicano) Eusébio para o Panteão Nacional. Por uma vez, a nossa classe político-mediática ouviu a voz do povo e fez-lhe a vontade, ainda que atropelando todas as regras. O que também diz muito sobre Portugal. Mas neste caso mal.

quarta-feira, 15 de janeiro de 2014

PARA ALÉM DA ESPUMA: um artigo de Renato Epifânio.


por Renato Epifânio (Este texto representa apenas o ponto de vista do autor, não da PASC, nem das associações que a compõem).




É apenas um sinal, um pequeno sinal, nem sequer muito significativo, mas, ainda assim, um sinal positivo. Numa daquelas votações que no final de todos os anos se fazem, a palavra “bombeiro” foi eleita a “palavra do ano”. À frente de uma série de outras palavras da moda: “irrevogável”, “inconstitucional”, “pós-troika”, etc..

No nosso circo político-diplomático, sabe-se que as palavras já perderam quase todo o seu valor intrínseco. Só se discute a espuma. A palavra “bombeiro” é, por aquilo que denota, o contrário de tudo isso. Lembra-nos que há gente que não navega apenas na espuma dos dias, que há gente que não fala muito, mas faz. E isso faz toda a diferença.

terça-feira, 14 de janeiro de 2014

ALGO A MUDAR EM 2014: um artigo de Renato Epifânio.


por Renato Epifânio (Este texto representa apenas o ponto de vista do autor, não da PASC, nem das associações que a compõem).



A consciência dos povos também se formata por agendas mediáticas e, não obstante a pulverização dos meios de comunicação social (sobretudo na internet), a televisão continua a ser o meio por excelência. Por isso, continuo a defender um Serviço Público de Televisão, que saiba difundir a visão que mais tenha a ver com os interesses estratégicos de Portugal.

Hoje, isso está ainda muito longe de acontecer. Apenas um exemplo: a atenção que a RTP (Rádio Televisão Portuguesa) dedica, em geral, ao espaço lusófono. Em comparação com o acompanhamento que dedica a outros espaços geopolíticos, a única conclusão possível é que para a RTP o espaço lusófono continua a ser algo de residual.

Dos outros canais nem vale a pena falar, pois ainda conseguem ser piores.

Quando há alguma notícia é, em regra, pelas piores razões, como se tudo o que acontece no espaço lusófono fosse, por definição, mau. As boas notícias (quase) nunca aparecem nos grandes noticiários - antes são remetidas para guetos televisivos. Tudo o mais parece servir apenas para perpetuar os lugares-comuns de sempre: “o Brasil é o país do samba e do futebol”, a “África é um continente perdido”, etc.

É bem verdade que o mau exemplo vem de cima. Alguém me sabe explicar, por exemplo, porque todos os nossos líderes políticos aparecem sempre com as bandeiras de Portugal e da União Europeia (para além da bandeira partidária) e nunca também com a bandeira da CPLP: Comunidade dos Países de Língua Portuguesa? Bastaria esse pequeno gesto simbólico para que a Lusofonia tivesse um peso maior no nosso espaço mediático.

No muito a mudar em 2014, que algo mude nesta área. Um excelso Ano Novo!

segunda-feira, 13 de janeiro de 2014

OLHAR EM FRENTE: um artigo de Jorge Marques.


por Jorge Marques (Este texto representa apenas o ponto de vista do autor, não da PASC, nem das associações que a compõem).



Mais um ano que começa, mais um ano que devia ser de esperança, um tempo que achamos sempre que se vai renovar a si mesmo. Escrevo estas linhas com alguma preocupação, mesmo em tempo de esperança, porque constato que já não bastava o pensamento e a mentalidade contabilística do Presidente da República e do Governo, sempre voltados para o passado, sempre a olhar para trás, porque agora temos também os media a bombardear-nos com o mesmo tipo de balanços. Mas o passado já não se altera, já foi e nós estamos sedentos é de futuro. 

Parece que temos que gritar mais alto que queremos olhar para a frente, que queremos saber e ouvir como é que vamos construir o futuro, que queremos ouvir aqueles que nos sabem dizer o que vai ou pode acontecer. Não queremos ouvir a mesma gente do costume, esses esgotaram o discurso e continuam presos à sua imagem, prendem-nos ao passado e presente porque estão bem, a crise ainda não lhes bateu à porta. 

E num começo de ano seria de esperar que alguém nos viesse dizer alguma coisa sobre este assunto, mas não, uns e outros desfazem-se em balanços, naquilo que aconteceu e não aconteceu ou devia ter acontecido. Pior, receio que esteja na sua mente passar mais um ano a fazer comparações com o trimestre homólogo do ano anterior, que subimos mais umas décimas numa coisa, umas centésimas noutras, que não subimos noutras porque a conjuntura internacional nos foi desfavorável. Até quando vamos suportar estes discursos que tanto eco têm nos media?

Já percebemos todos que o mundo, o dos outros e o nosso, estão virados ao contrário do que nos vendem e que a solução para caminhar nesse mundo é aprender também a fazer o pino e andar com as mãos no chão, mas não, continuam a dizer-nos que tudo começa a melhorar. Mais próximo das próximas eleições, o país será de novo um oásis. Até quando vamos suportar esta farsa?

Temos todos que concordar que só num mundo voltado ao contrário, possa ser um tribunal e os seus juízes a dizer a um governo que ele não tem qualquer estratégia, que só toma medidas avulsas, quando o PR encolhe os ombros e o governo, dito executivo, não percebe isso mesmo. Não tardará muito e o país terá que pedir a esses juízes um programa de governo e uma governação transparente. E ninguém acha isto anormal, andam preocupados em contar os votos dos juízes e saber das suas declarações de voto?

Faz falta, como diz o escritor espanhol Munoz Molina, uma serena rebelião cívica, que à imagem e semelhança do movimento americano pelos direitos civis, utilize com inteligência e astúcia todos os recursos das leis e a força da mobilização, para que se possam resgatar os territórios de soberania que foram usurpados pela classe política. 

Os partidos políticos colonizaram todo o espaço público, os espaços da Sociedade Civil que deveriam ter-se mantido abertos ao mérito, ao debate livre e à cidadania.

Em 40 anos de democracia não houve qualquer pedagogia democrática, porque deliberadamente ou por ignorância, os partidos políticos esqueceram-se que a democracia ensina-se, aprende-se e pratica-se.

Quando tal não acontece no quotidiano fica o vazio, a corrupção, a demagogia e a lei dos mais fortes contra os mais fracos, ou seja, a lei da selva.

É importante perceber hoje quem são os verdadeiros inimigos da democracia, para que não se aceite que são os manifestantes da rua ou das galerias do parlamento, que são os pensionistas ou reformados, que são os desempregados… porque a única maneira de prejudicar a democracia é com os maus exemplos, actos e palavras daqueles que juraram defender esta mesma democracia, como está a acontece com:

  • A violência verbal dos políticos, sobretudo dos deputados, governantes e respectivas oposições;
  • A incapacidade de perceberem os problemas e encontrarem soluções comuns relativos às reais circunstâncias do país;
  • A irresponsabilidade, individual e colectiva, da gestão do bem comum;
  • A mentira pré-eleitoral, espelhada no comportamento depois das eleições;
  • A falta de rigor na gestão dos dinheiros públicos, que nos arrastou para a falência;
  • A permissividade e indulgência face ao roubo;
  • A demagogia populista;
  • O desprezo pelas leis;
  • A falsa vitimização;
  • O narcisismo tosco;
  • A omnipresença dos políticos e dos seus porta-vozes em todos os media, gerando uma falsa realidade do país e discriminando a livre opinião dos cidadãos com mais mérito;
  • A total perda de confiança nas instituições em que deveríamos confiar.

Temos que dizer, neste começo do ano, que a prática da nossa democracia deixou de ser democrática, é só aparência, que já não nos representa, porque não participamos nela, mas também porque deixou de existir espaço para que se cumpra a Cidadania e a Sociedade Civil se possa exprimir. Nesta democracia já não há povo, e como ele é ainda o soberano, houve um golpe constitucional. 

Numa análise fina e sujeita a referendo popular, facilmente se poderia concluir que a prática da nossa democracia deixou de ser constitucional. 

Temos muito a fazer este ano para repor a genuína legitimidade democrática… e esse é sobretudo um desafio para a Sociedade Civil.

sexta-feira, 3 de janeiro de 2014

MAIS E MELHOR EMPREGO NA EUROPA - SINERGIAS ENTRE PARCEIROS SOCIAIS: um artigo de Maria Perpétua Rocha, Coordenadora da PASC.


O CIFOTIE - Centro Internacional de Formação dos Trabalhadores da Indústria e Energia, uma das Associações membro da PASC - Plataforma Activa da Sociedade Civil, organizou entre os dias 3 e 5 de Outubro de 2013, em Lisboa, uma Conferência Internacional acerca de como “Os Novos Desafios Estruturais No Mercado de Trabalho Devem Gerar Mais e Melhor Emprego na União Europeia”. A Coordenadora da PASC, Maria Perpétua Rocha, marcou presença numa mesa redonda, realizada no dia 4, cujo tema de discussão foi “Parceiros Sociais e Sociedade – Sinergias para Mais e Melhor Emprego na Europa” . Fica aqui o registo da sua intervenção.


por Maria Perpétua Rocha (Este texto representa apenas o ponto de vista do autor, não da PASC, nem das associações que a compõem).


Podemos começar por perguntar: qual o objectivo primeiro para o desenvolvimento e o progresso?

Será difícil haver uma paz duradoura, prosperidade, igualdade e solidariedade se não houver um entendimento comum sobre a resposta a esta questão. Se tal não acontecer, num contexto de globalização, o risco será muito elevado.

A resposta a esta questão tem que recolocar o indivíduo e a sua relação com o planeta como preocupação central nos modelos sociais do século XXI e a economia deverá adaptar-se enquanto instrumento que serve o desenvolvimento.

Em relação ao tema UE e à sua capacidade de vir a gerar mais e melhor emprego no futuro próximo permitam-me citar Peter Drucker:

As empresas que não se adaptam aos novos tempos morrem.

Será licito aplicar esta recomendação de Drucker à UE? 

Penso que sim. A UE, ao adoptar um modelo de capitalismo livre, baseado numa competitividade de contornos cruéis, pouco transparente e focada no mercado, tem levado a uma colonização da vida dos Cidadãos Europeus pela Economia financeira e especulativa.

Podemos assim dizer que a União Europeia, e alguns dos seus Estados Membros, se aproximam cada vez mais de uma lógica empresarial, num ambiente de economia neo-liberal, focada nos mercados e na lógica financeira.

A UE tem ignorando que, em última análise, são os cidadãos, não só a razão da sua existência, mas igualmente, mesmo nesta lógica de mercado, os que inovam, os que produzem, os que consomem.

Por isso, a frase de Peter Drucker faz todo o sentido se a transpusermos para a dinâmica empresarial da União Europeia. 

Assim sendo, será que a UE tem uma Visão Estratégica para a sua afirmação no cenário mundial nesta primeira metade do século XXI?

Todos sabemos que as grandes empresas, as que se têm mantido no mercado como marcas consolidadas, apesar da onda de fusões e aquisições das duas últimas décadas, são aquelas que tiveram a percepção, nos anos noventa, de que a sua diferença competitiva estaria no nível de satisfação dos seus clientes e dos seus recursos humanos.

Nesta perspectiva, seria importante que em cada Região, em cada País da UE, se aprofundasse o conhecimento sobre a percepção que os cidadãos, quer enquanto consumidores quer trabalhadores, têm sobre os indicadores de qualidade de vida e índices de felicidade. Estes deveriam ser parte integrante da estratégia competitiva da UE.

Será que a União Europeia se está a adaptar aos novos tempos, aos novos desafios?

A resposta passa pela identificação de alguns aspectos que derivam do título desta conferência:

  • Que desafios estruturais para o mercado de trabalho da EU? 
  • Que vantagens justificam a possibilidade da criação de mais emprego na EU, tendo em conta esses desafios? Se sim, que segmentos influenciarão a sustentabilidade da economia europeia? 
  • Que condições e que competências levarão a melhores empregos? 
  • Estão os cidadãos europeus felizes com a actual percepção de que consumo e progresso estão associados? 

Considero que a palavra desafios tem duas aplicações:

  • Uma forma de ultrapassar as dificuldades identificadas; 
  • A capacidade de desenvolver instrumentos que convertam oportunidades em realidades. 

Assim, na vertente das dificuldades, não podemos ignorar:

  • O envelhecimento população, que será de longa duração dada a involução demográfica; 
  • O desemprego crescente, particularmente entre os jovens; 
  • A fuga dos melhores entre os mais jovens em busca de emprego; 
  • A perda de competitividade em alguns dos segmentos tradicionais da produção, que tenderá a agravar-se afectando o nível de exportações; 
  • A deslocalização do emprego pelo outsourcing
  • A redução do trabalho em áreas convencionais, devido aos níveis crescentes de automatização e o subsequente agravamento do desemprego; 
  • A transferência progressiva do proveito do trabalho para accionista e gestores em detrimento da compensação laboral;
  • O nível de insatisfação dos cidadãos, a baixa de poder de compra e o seu reflexo no mercado interno europeu; 

Neste contexto, a manter-se a lógica de um modelo de economia neo-liberal, o desiderato de mais emprego na UE parece aproximar-se tão só de uma miragem. 

Será muito improvável que a UE consiga suster o actual nível da economia e muito menos voltar aos índices de crescimento que ocorreram antes da recessão de 2008.

Na vertente oportunidades, a UE mantém, em relação ao resto do mundo, vantagens competitivas importantes, que assentam na História, na Cultura e nos níveis de Educação da sua população. Delas poderão advir novas oportunidades não só de mais emprego, mas também de melhor emprego, aumentando o índice de felicidade da população e contribuindo para sustentabilidade ecológica do planeta.

Tem a UE no seu código genético, portanto, a potencialidade de pensar, encontrar e viver uma outra forma de economia.

Uma economia em que o valor psicológico e social dos bens intangíveis, entre os quais a cultura e a felicidade, assumam um peso crescente, que assuma como prioridade o desenvolvimento da sociedade humana. Este decorre de um desenvolvimento material e espiritual simultâneos e sinérgicos.

De acordo com alguns estudos sobre a chamada Economia da Felicidade, os novos modelos económicos deveriam basear-se num pensamento integrado que desenvolvesse o bem comum e em que os pilares de crescimento estariam associados ao desenvolvimento da Economia Social, à preservação da Natureza, à preservação e promoção da Cultura, à boa Governação.

Neste contexto é expectável que venha a haver um crescimento significativo de emprego em sectores ligados à Economia Social, à Economia de Subsistência, à Economia da Cultura, ao Turismo e à Economia Verde. 

Numa UE que queira continuar a assumir a liderança nos capítulos do desenvolvimento humano, da sustentabilidade do planeta e da paz mundial, o ênfase deverá ser colocado na relação entre os indicadores de felicidade e os níveis de produtividade e não desta com o consumo. As empresas deverão estabelecer uma parceria com os seus trabalhadores de forma a valorizarem o seu capital colectivo.

A mudança de paradigma do actual modelo de desenvolvimento da UE levaria à necessidade de desenvolver competências tais como conhecimento, auto-disciplina, mediação, comunicação, criatividade, capacidade de criar ambientes de bem estar para o próprio e para os outros, de promover o dialogo e a resiliência nas comunidades e promover a coesão social.

A par destes sectores emergentes das economias, a UE deverá assegurar que mantém a liderança na capacidade de inovar e desenvolver tecnologias, em particular as que contribuam para resolver os graves desequilíbrios ecológicos que ameaçam o planeta e as espécies.

Na perspectiva da criação de emprego, é importante sublinhar que, tendo em conta os cenários descritos, esta poderá já não estar dependente das grandes empresas mas cada vez mais da iniciativa de pequenos empreendedores, da criação de pequenas oficinas/empresas e da criação de redes transnacionais.

O equilíbrio no mundo de trabalho do futuro, seja dos empresários, seja dos trabalhadores, tem que ser encontrado no desenho de um triângulo onde se encontram o Sistema Económico, o Sistema Político e o Sistema Social, este último cada vez mais integrado no contexto de uma Sociedade Civil organizada.

Termino sublinhando que é essa Sociedade Civil que através do consumo alimenta o Sistema Económico e através dos impostos suporta o Sistema Político.

Por isso, a Sociedade Civil não pode subordinar-se a ambos, tem que assumir o seu protagonismo enquanto pilar fundamental da sustentabilidade competitiva da UE.

terça-feira, 10 de dezembro de 2013

NÃO SOMOS O QUE APRENDEMOS: um artigo de Jorge Marques.


por Jorge Marques (Este texto representa apenas o ponto de vista do autor, não da PASC, nem das associações que a compõem).



Eu sei que aquilo que vou escrever é polémico, mas o pior de todos os vícios é continuar a acreditar em coisas que já não fazem qualquer sentido, continuar a pensar dentro de uma caixa muito pequena, sobretudo porque isso só serve mesmo para alimentar falsos estatutos sociais de inutilidade pública.

Não somos o que aprendemos, porque na nossa sociedade do conhecimento a característica dominante é a desactualização muito rápida desse conhecimento e a necessidade permanente e urgente de o substituir. O que aprendemos tem, por isso, uma validade muito curta, relativa, e há mesmo quem defenda que um dia destes precisaremos de escolas para desaprender, para deitar fora aquilo que já não tem valor, mesmo intrínseco, e aplicar a ecologia na limpeza da memória.

Isto traz-nos uma série de problemas e que vão do estatuto que se adquire com a aprendizagem nas escolas, sobretudo nas universidades, até ao perfil, comportamento e estatuto dos próprios professores. Nunca é demais lembrar, apesar de toda a gente o repetir, que o centro desta aprendizagem é o aluno, mas um aluno que é agente da melhoria da sociedade, e não o professor. Toda a gente o repete, mas quase ninguém o pratica. 

Então, mas se não somos o que aprendemos, qual é a alternativa a esse dogma? A alternativa é que, não somos o que aprendemos, mas como aprendemos. Em resumo, o que é mesmo importante é a forma como nos ensinam a abordar os problemas e a encontrar as soluções; a forma como nos relacionamos com os outros para encontrar essas soluções; a autonomia que nos dão para contrariar o que está estabelecido e procurar novos caminhos; a minimização do erro e a necessidade de correr riscos; a criação do prazer da iniciativa; a não dependência; a procura; o incentivo ao pensamento e à acção; o sentido e prática da cidadania e do ser Gente com ética, moral e humanidade; a minimização de um estatuto e a assunção da qualidade de aprendiz para toda a vida; a humildade; o não ser mestre, muito menos professor, sem primeiro ter sido aprendiz. 

Tudo o que nos ensinam acaba por esquecer-se, mais tarde ou mais cedo, dizem até alguns ex-ministros da educação que os alunos já ficam desactualizados no dia em que terminam os seus cursos.

Mas o que não esquecemos e passamos a praticar com esta forma de aprender é que estamos a criar gente dependente; gente para a subordinação; para um emprego; para a exibição dos diplomas; para a não iniciativa; para o não risco; para a emigração; para a resignação ou para a indignação e não para a acção; para a não formação de verdadeiros líderes; para a criação de gente egoísta e sem qualquer ética ou moral social ou rudimentos de cidadania. A universidade não pode estar sozinha na passagem destas licenças de cidadania, deve exigir-se uma dupla certificação em que a sociedade tem que ser parceira. A pobreza moral e intelectual do que vemos hoje no sistema político e nos políticos é fruto disto mesmo. 

Ensinaram-nos sim, a obedecer, decorar, imitar, analisar, fazer brilhantes diagnósticos, repetir e elogiar a voz do dono, fazer carreira independentemente do carreiro. Não nos ensinaram a inovar, fazer diferente, discordar e criar alternativas, exigir dos professores e dos governantes… porque os professores, na maior parte dos casos e relevem-se aqui as boas e muitas excepções, apenas sabem falar de e não sabem fazer o que falam, sabem o programa, mas não sabem ensinar a como aprender.

O país tem um problema grave para além da economia e da contabilidade do Estado, é que não forma nem líderes, nem cidadãos preocupados com o bem comum… sim, porque a cidadania deve ser ensinada, praticada, avaliada e tem que ter um peso significativo na formação e no diploma final. Temos que fazer a discriminação positiva dos mais talentosos cidadãos, porque isto de saber quase tudo e não saber fazer nada, pode valer muito pouco, porque isso de ser talentoso para benefício próprio é apenas uma triste caricatura do homem económico que os economistas inventaram. Há até alguns nessa classe que publicamente manifestam a sua ignorância e dizem não perceber para que serve a história ou a filosofia e vendem isso na opinião pública. 

A própria universidade, que durante décadas dizia que não formava para o mercado de trabalho, vem agora auto-elogiar-se das suas taxas de empregabilidade, vinte anos atrasada, pelo menos. Porque o que a Universidade deveria estar hoje a preparar e a fornecer à sociedade eram líderes e empreendedores que dinamizassem o tecido empresarial, que criassem pequenas empresas e emprego, eram cidadãos esclarecidos e empenhados na dinâmica política e social de um país que pode cair na resignação, na não alternativa e não conseguir sair de lá tão cedo.

Mas claro que a maior parte dos professores não sabe ensinar isso, uma vez que eles próprios são seres subservientes relativamente ao poder económico e ficam-se pela ambição de uns lugares e uma remuneração de favor nos corpos sociais das empresas ou então bajulam os governantes na expectativa de uns tachos na vaca sagrada da administração pública ou do governo ou, pior que isso, deformam deliberadamente e por encomenda a opinião pública nos media.

Professores e governantes nunca podem sentir-se confortáveis no seu papel, a sociedade tem que exigir deles e saber reconhecê-los, distingui-los e compensá-los quando for caso disso! Que me desculpem os que lutam contra tudo isto, mas também chegou a altura de limparem o terraço e não enfiarem o nariz na areia. 

Depois da indignação, temos que partir para a acção e aí precisamos de quem saiba fazer. Por isso, não queremos que a Universidade se substitua à Sociedade Civil, como alguns académicos parecem agora pretender, isso não se fabrica em laboratório, mas que produza cidadãos que tornem essa sociedade cada vez melhor e com muito trabalho.