quarta-feira, 26 de dezembro de 2012

O PROBLEMA DO FINANCIAMENTO E SOBREVIVÊNCIA DAS ASSOCIAÇÕES DA SOCIEDADE CIVIL em 2013: um artigo de Rui Martins.


por Rui Martins (Este texto representa apenas o ponto de vista do autor, não da PASC, nem das associações que a compõem).

 


Em 2013, as associações em Portugal, sejam elas humanitárias, culturais ou cívicas, vão enfrentar um tremendo desafio que acabará por ditar o fim a muitas delas. Não sabemos quantas das cerca de quarenta mil associações continuarão a existir no final de 2013, mas sabemos que serão muito menos que aquelas hoje existem.

Em consequência desta redução, Portugal  - que já tem hoje dos mais baixos índices de participação cívica e associativa do mundo desenvolvido - ficará ainda mais pobre. As funções sociais cumpridas pelas associações humanitárias, de solidariedade social e culturais não poderão ser compensadas por um Estado que por pressão dessa torpe "União Europeia" parece apenas obcecada com o nosso empobrecimento coletivo.

O próximo ano será um ano fatal para muitas associações portuguesas.

Pressionadas por cinco frentes, muitas não irão sobreviver:

  1. Perda de sócios · Em Portugal sempre existiu um baixo nível de participação associativo, mas agora, a redução demográfica, a demissão voluntária da vida pública por parte de muitos cidadãos e de quase todos os jovens parece maior do que nunca. Uma Sociedade Civil amorfa, desorganizada e em severa erosão abre espaço a todo o tipo de abusos por parte do Poder Político representativo e do Poder Económico. Sem associados, não podem existir associações e sem associações não pode haver uma Sociedade Civil organizada que possa constituir-se como contrapoder a toda a sucessão de abusos que os austeritários do Poder lançam sobre nós.
  1. Sócios que não podem pagar quotas · Num país onde o desemprego já alcança mais de 1.2 milhões de cidadãos, é evidente que a capacidade para continuar a pagar quotas ou para aderir e contribuir para novas associações é muito limitada. Imersos num mar de dificuldades financeiras, os portugueses cortam todas as despesas não essenciais e entre estas estão, naturalmente, as quotas das associações. Em consequência, muitas associações sofreram nos últimos anos uma compressão drástica do seu principal financiamento e navegam hoje claramente abaixo da linha de água, arriscando um afundamento definitivo a muito curto prazo, a menos que algo venha inverter radicalmente a situação nos próximos meses.
  1. Depressão coletiva · Em virtude de uma sucessão interminável de cortes, de camadas sucessivas de novos impostos, de desvios constantes às previsões e de erosão da rede social de apoio do Estado, instalou-se (muito por culpa de um discurso catastrofista do regime) uma autentica depressão coletiva que paralisa a vontade individual em participar ativamente na Sociedade Civil e na efetiva recuperação económica do país. A depressão (pela via do desemprego galopante, da eternização da recessão e do aumento brutal da fiscalidade) arrasta os cidadãos para a bovinidade. Empurrados pelo medo (do desemprego, de perseguições policiais caso apareçam em manifestações, da perda de rendimentos devido à fiscalidade desbragada, etc.), os cidadãos eclipsam-se da vida cívica. Com esta demissão coletiva, perdem as associações e com elas perde vida a Sociedade Civil. A passividade, o bovinismo, o abstencionismo instalam-se, propulsados pela Depressão coletiva que se instala de forma duradoura entre nós.
  1. Fim ou redução drástica de subsídios · Para o exercício das suas funções sociais, humanitárias ou culturais, muitas associações recebiam contributos na forma de subsídios. Nos últimos dois anos registou-se uma queda brutal neste tipo de ajudas estatais, entre os vinte e os sessenta por cento; em consequência, e num contexto de severa redução de pagantes de quotas e de recessão (que reduziu os proveitos de atividades "comerciais" que exercem algumas associações), muitas associações vivem hoje em graves dificuldades. Aquelas associações que empregam colaboradores (estima-se que a Economia Social tenha mais de cem mil empregos) têm dificuldades crescentes em pagarem estes salários, já que boa parte era proveniente precisamente desses subsídios que agora o Governo Central e os municípios reduziram a um mínimo absolutos.
  1. Propostas para que as quotas passem a pagar IVA · Além de todas estas dificuldades (erosão demográfica da base associativa, redução das quotas, compressão dos subsídios, depressão coletiva) paira sobre as associações uma ameaça ainda maior: insaciável na sua voracidade para aumentar a base fiscal do orçamento, pondera-se em círculos próximos do Governo a introdução do pagamento do IVA nas quotas pagas pelos associados. A confirmar-se, este ataque sem precedentes à Sociedade Civil organizada terá consequências trágicas num tecido associativo já muito ameaçado pelos problemas acima listados. Queremos crer que ainda resta alguma racionalidade neste governo tão empenhado em ir "além da troika", "custe o que custar", empobrecendo sempre mais e mais este país, na mira apenas de exílios dourados em Bruxelas ou no FMI para os seus dóceis executantes. Queremos crer, mas duvidamos da racionalidade dessa crença.

domingo, 16 de dezembro de 2012

REFUNDAR A AUTENTICIDADE DOS ORGÃOS DE SOBERANIA: um artigo de Jorge Marques.

 

por Jorge Marques (Este texto representa apenas o ponto de vista do autor, não da PASC, nem das associações que a compõem).

 

 

Pensávamos nós que a figura do Presidente da República era o garante da defesa da Constituição e o Provedor do Povo, mas isso não pode resumir-se a palavras ou boas intenções, tem que ter expressão prática e autêntica. O que é que eu quero dizer com isto?

Se um Presidente da República, que avisou que estava a socorrer-se da opinião de especialistas, que não admitia pressões na sua posição sobre o Orçamento, decide ter dúvidas e enviar para o Tribunal Constitucional esse Orçamento, então o assunto reveste-se de alguma gravidade e de eventual e potencial prejuízo para o país e para os portugueses.

Que mesmo assim decida promulgar tal Orçamento, já se compreende menos, porque a aplicação do Orçamento pode de facto prejudicar, destruir, matar, levar à falência, levar à pobreza, destruir famílias e outras consequências negativas para os cidadãos, para o país e ele sabe isso. A promulgação e envio para o TC, corresponde a um lavar de mãos e de responsabilidades a que nenhuma explicação pode dar verdadeira resposta.

O TC decidirá em seis meses porquê? Não podem ser seis dias, porquê? Nada justifica o arrastar da decisão, a não ser uma vez mais o lavar das mãos e das responsabilidades, porque quando ela chegar já será tarde para a impedir. Infelizmente ainda está na nossa memória o mau exemplo do ano passado.

No final o Presidente da República dirá que avisou e cumpriu a sua missão, o Tribunal Constitucional que julgou dentro das suas competências e dos prazos previstos, o Governo que fez o seu trabalho e se sujeitou às regras da democracia. Os atingidos negativamente por estas medidas não irão poder sequer reclamar, aqueles que não sobreviverem a esta Acto muito menos. Cumpriu-se a democracia!

Como é que tudo isto é possível, que democracia é esta onde medidas inconstitucionais de um Orçamento e de um Governo não têm qualquer consequência e acontecem segundo a sua exclusiva vontade? Como se chama uma democracia onde apenas funciona a vontade do governo e não há mecanismos para impedir os seus abusos? Não foram os erros dos sucessivos governos que nos trouxeram a esta triste situação?

Refundar o Estado começa por aqui, começa no exercício pleno das competências dos Órgãos de Soberania que custam caro ao país e aos contribuintes e que existem para decidir em situações difíceis como esta.

Aquilo que me fica depois de tudo isto, é que há muita falta de verdade e de autenticidade nos principais suportes do nosso Sistema Político e que o poder político terá que regressar de novo à sua fonte, ao povo, para que se renove e faça novas delegações ou melhor, para que este se refunda.

O problema é que no dia seguinte tudo continua na mesma, como se nada tivesse acontecido!

segunda-feira, 10 de dezembro de 2012

A OLÍVIA COSTUREIRA DO PSD: um artigo de Jorge Marques.


por Jorge Marques (Este texto representa apenas o ponto de vista do autor, não da PASC, nem das associações que a compõem).

 

 

Existem no PSD duas caricaturas das chamadas Olívia-Patroa e da Olívia-Costureira e que são Passos Coelho e Moreira da Silva.

O primeiro, qual cigarra, tem a missão histórica do contabilista e cobrador de impostos que nos explora em nome dos nossos bárbaros credores, o segundo é assim uma espécie de formiguinha trabalhadora, qual aranha, que vai tecendo a sua teia.

Sou claramente adepto do Formiga e só me irrito com ele quando quer fazer passar a sua Plataforma para o Desenvolvimento Sustentável, como se de uma organização da Sociedade Civil se tratasse. Sou adepto porque alguém tem que falar de futuro.

E irrita-me porque um conjunto de eventuais boas ideias, que em breve serão apresentadas num relatório público, não precisa de começar com golpes de teatro e de pequenas mentiras tipo Gaspar.

Não é Sociedade Civil porque quer o seu líder, quer a maioria dos seus quatrocentos membros que elaboraram tal relatório, fizeram um trabalho para o PSD, são militantes ou simpatizantes do PSD, são candidatos às vagas de próximos governos e cargos públicos e muito legitimamente investem no seu futuro pessoal.

Uma Plataforma, verdadeiramente da Sociedade Civil, porque as conheço, não tem este espaço mediático seja na televisão, seja em páginas inteiras dos jornais de referência. A verdadeira Sociedade Civil, aquela que luta pelo bem comum, nem sequer é notícia, não gostam dela, porque não tem o rosto mediático de nenhum político candidato a qualquer coisa. Mas isso não é da responsabilidade de Moreira da Silva!

A nossa Olívia-Costureira é certamente um bom candidato á Presidência do PSD, é certamente um bom candidato a Primeiro-Ministro, tem certamente gente muito capaz neste Grupo dos 400, mas não precisa de apresentar-se coberto de véus, fingindo ser o que não é, o PSD é apenas uma pequeníssima parte deste país e não pode falar em nome dele.

Mas o relatório que em breve dará á luz e que terá boas ideias, não é o fim do caminho, porque então seria apenas mais um dos muitos relatórios a que já nos habituámos. O relatório que vai ser apresentado, até porque contém o trabalho de tanta gente, merece muito mais do que as 24 horas de sucesso mediático e umas quantas apresentações público/privadas. Tanto trabalho assim, não é o fim de nada, mas apenas o começo de qualquer coisa, que só o será, se tiver alguma consequência prática.

As minhas expectativas, até porque gosto das Olívias Costureiras, são as seguintes:

  • Que se reconheça já, que este governo está esgotado de soluções há muito tempo, que apenas se arrasta;
  • Que este relatório, que não é ainda para a Sociedade, sirva para a candidatura de Moreira da Silva a Presidente do PSD no seu próximo e extraordinário congresso;
  • Que essa candidatura, com este programa, sirva para o eleger como Primeiro-Ministro;
  • Que, ao contrário dos seus antecessores, ele cumpra esse programa e que quando tiver que o contrariar, recolha a legitimidade democrática para o fazer.
 
Espero sinceramente que a divulgação deste trabalho de 400 pessoas, independentemente das suas motivações, não sirva para confundir, para limpar ou fazer esquecer os sucessivos erros do actual governo e se chame a isso fazer política.

É apenas o princípio de um processo que só chega ao fim, só valeu a pena, se tiver consequências e não se consumir nos media.

domingo, 9 de dezembro de 2012

ESQUERDA E DIREITA, CONCEITOS OBSOLETOS E BLOQUEADOS: um artigo de Rui Martins.


por Rui Martins (Este texto representa apenas o ponto de vista do autor, não da PASC, nem das associações que a compõem).


 
Não é sem razão que se fala hoje de “pensamento único”. A chamada “esquerda moderada”, espaço político e parlamentar que em Portugal é preenchido pelo Partido Socialista, de facto, assumiu como suas as principais causas do neoliberalismo, a partir da década de 90, e quando esteve no governo, em Portugal e no resto da Europa, optou por ter uma ação não muito diversa da dos seus clássicos oponentes políticos, situados imediatamente à direita do espectro político.

Esta conformação da “esquerda democrática” esvaziou a sua ação como alternativa de governo, para além de um malsano e vazio “rotativismo” democrático, de escasso valor prático e efetivo. Com este posicionamento, tornou-se também muito difícil uma aproximação às esquerdas mais “radicais” e, logo, eliminou-se a capacidade para erguer uma “frente popular” capaz de se contrapor a alianças mais fáceis e fluidas entre os partidos de direita e centro-direita.

Mais à esquerda, pelas bandas da extrema esquerda, parece enclausurada uma lógica estéril de protesto, sem preocupações práticas ou sem buscar a necessária aproximação ao centro-esquerda que é necessária para construir uma alternativa de governação à esquerda.

A Esquerda está, assim, bloqueada, sem respostas nem credibilidade para lograr recolher maiorias eleitorais, já que está comprometida com governações muito semelhantes àquelas do centro-direita ou se fechou em estéreis partidos de “contestatários profissionais”. A democracia carece de renovação e esta, aparentemente, não pode brotar nem nos partidos de Direita (demasiado enfeudados aos Grandes Interesses do Capital e da Especulação), nem dos partidos “de protesto” da extrema esquerda, nem dos descaraterizados partidos da “esquerda democrática”. A saída para este encravanço passa, assim, por uma resposta transversal, não tecnocrática mas cidadã, que recolha as melhores propostas e ideias de onde quer que elas venham, sem pudores ou complexos ideológicos e que reforce sempre e constantemente a vertente da cidadania e da democracia participativa.

sábado, 1 de dezembro de 2012

ENTRE A DITADURA DOS MERCADOS E A NOVA REVOLUÇÃO DO PROLETARIADO: um artigo de José Eduardo Garcia Leandro.


por José Eduardo Garcia Leandro (Este texto representa apenas o ponto de vista do autor, não da PASC, nem das associações que a compõem).


 
Portugal encontra-se no centro de uma tempestade político-económico-social; não foi nada que não tivesse sido previsto. A falta de reformas estruturais sérias e atempadas e erros de gestão confluíram com a grande crise financeira mundial iniciada em 2008.

Do choque dos dois grandes sistema políticos dominantes no século XX (capitalismo e comunismo) resultou a queda do comunismo e da sua Pátria (URSS) e o regresso arrogante do capitalismo selvagem.

A Europa tinha descoberto a social-democracia e vindo a construir progressivamente a mais inteligente solução de convivência pacífica e de desenvolvimento da sua história, com um modelo social próprio. A União Europeia conseguia fazer conviver a economia de mercado com os direitos humanos e sociais dos trabalhadores e foi-se tornando um pólo de atração para todos os vizinhos, ao mesmo tempo que ia enriquecendo e aumentava a sua influência mundial.

Porém, ocorre que o modelo social europeu necessita de Estados ricos, o que com a globalização da informação, da tecnologia e do comércio tem vindo a diminuir, pois há mais competidores no mercado; os Estados Europeus têm economias a caírem e já têm dificuldades para manter o seu modelo social intocável.

A ditadura dos mercados, os problemas económicos, a deslocalização das empresas e o aumento do desemprego têm vindo a criar o desespero na população, o que a pode tornar fácil presa dos extremismos à solta.

Os ideólogos do actual Governo criam que tudo se resolveria rapidamente acertando as contas do Estado e que o mercado se autoregularia; enganaram-se várias vezes e população vê a economia agonizar e o desemprego disparar como nunca.

Foram dados assim pretextos aos ideólogos dos vários comunismos (existentes em Portugal) para voltarem à imposição so seu velho sonho, agora acreditando que tal é verdadeiramente possível à escala mundial. Afinal, Marx sempre teria razão. A fraqueza da situação económica americana e europeia recriou essa ambição e apostam no quanto pior, melhor.

Assim, usarão todos os meios para abaterem o actual Governo e não irão dar tréguas; ocorre que os grandes poderes não estão habituados a perder e, se necessário, a guerra será uma solução (a reeleição de Obama pode adiar esta opção); os velhos inimigos geopolíticos (Rússia e China) são agora os competidores, mas com a nuance de terem um forte capitalismo de Estado com mais sucesso que as democracias ocidentais.

Falharam rotundamente os líderes europeus e os portugueses.

Existe na União Europeia e em Portugal algum poder político e económico que nos faça saír desta situação de esvaziamento progressivo, a caminho do zero?

Creio que não! Os Partidos do arco governamental não se entendem. Preparemo-nos para o pior! Entre outros, Portugal pode ter sido eleito como campo de uma batalha especial.

Lisboa, 15 de Novembro de 2012.

sexta-feira, 30 de novembro de 2012

PROPOSTA PARA UMA SEMANA DE TRABALHO DE 4 DIAS: um artigo de Rui Martins.


por Rui Martins (Este texto representa apenas o ponto de vista do autor, não da PASC, nem das associações que a compõem).


 
Nos EUA, começam a multiplicar-se os exemplos de empresas que estão a mudar a sua semana de trabalho para apenas quatro dias úteis. E não se tratam de semanas de quatro dias e quarenta horas de trabalho, mas de semanas de 32 horas, ou seja, optando de forma consciente e voluntária para menos (e não mais) horas de trabalho.

A maioria optou por deixar de trabalhar à sexta-feira, mas algumas deixam ao critério do trabalhador a escolha do dia de semana mais conveniente.

A vantagem mais notória que estes empresários experimentam com a adoção de semanas de quatro dias é a melhoria significativa da qualidade do trabalho produzido: com menos tempo para trabalhar, há uma inclinação natural para desperdiçar menos tempo e o foco naquilo que é mais importante torna-se decisivo. A constatação é de que menos tempo, produz mais qualidade.

Mais tempo livre implica melhor qualidade de vida, menos absentismo (com a possibilidade de usar um dia na semana para tratar de assuntos pessoais), mais atividade e negócio para as atividades comerciais da comunidade onde se inserem estas empresas, menos custos operacionais, mais satisfação pessoal, realização humana e familiar e, decorrentemente, mais produtividade, menos desperdício e mais lucros para as empresas que adotam as semanas de quatro dias.

terça-feira, 27 de novembro de 2012

DO FEDERALISMO: O SOL NA EIRA E A CHUVA NO NABAL: um artigo de Renato Epifânio.


por Renato Epifânio (Este texto representa apenas o ponto de vista do autor, não da PASC, nem das associações que a compõem).

 


Causou brado, uma vez mais, a enésima declaração das autoridades alemãs, segundo as quais “a Alemanha não aceita mais financiamento a países sem fortes condições e perda de soberania”.

É extraordinário que mesmo algumas vozes assumidamente “federalistas” reajam com tanta indignação com a perspectiva de mais “perda de soberania”.
 
Extraordinário mas não surpreendente – é, de resto, por isso, que em Portugal é impossível qualquer debate público claro e consequente. Qualquer debate se transforma, mais cedo ou mais tarde, num jogo de sombras…

O debate em torno do federalismo europeu é um excelente exemplo disso. Grande parte da nossa classe mediática (ou seja, da nossa classe política e jornalística) assume-se, cada vez mais, como “federalista”. O argumentário, qual mantra, é sempre o mesmo: “só o federalismo pode salvar a Europa e Portugal”.

Não vamos agora discutir essa posição – já por várias vezes defendemos que, mesmo admitindo que o federalismo fosse desejável, ele não é de todo possível.
 
A Europa é demasiado diversa para ter um futuro político unificado a esse ponto. Essa diversidade é, de resto, a nosso ver, a nossa maior riqueza. Talvez na Idade Média – em que, para além de tudo o mais, havia uma mesma língua dominante e uma mesma religião hegemónica – isso tivesse sido possível. No século XXI, não vale a pena alimentar mais essa ilusão.

Mas para quem ainda a alimenta, exige-se o mínimo de coerência. Não se pode defender ao mesmo tempo o federalismo e ser contra as consequências necessárias de todo o processo federalista. Há, decerto, muitos modelos – mas não há nenhum em que não ocorra “perda de soberania”. Por mais que se deseje sol na eira e chuva no nabal, não há milagres. É pois tempo de falarmos de forma clara e consequente. Até porque esse eventual passo só será possível com um Referendo: o tal Referendo sobre a Europa tantas vezes prometido.

segunda-feira, 26 de novembro de 2012

O CEN - CONCEITO ESTRATÉGICO NACIONAL, SUA NECESSIDADE E DIFICULDADES: um artigo de José Eduardo Garcia Leandro.


por José Eduardo Garcia Leandro (Este texto representa apenas o ponto de vista do autor, não da PASC, nem das associações que a compõem).

 

 
(Publicado em versão reduzida e adaptada no Expresso de 20 de Outubro de 2012.)

Depois da aprovação da Constituição de 1976, enquadrante geral dos interesses nacionais, foi criado o CEDN - Conceito Estratégico de Defesa Nacional, aprovado pela primeira vez em 1985 e actualizado em 1994 e 2003.

Se a Constituição desenhou o grande quadro legal onde instituições e pessoas se deviam mover, já o CEDN era orientado para as grandes questões da Defesa Nacional, indicando cuidadosamente como se deveria proceder com as componentes não militares da Defesa, sendo seu primeiro responsável o MDN - Ministro da Defesa Nacional, e aprovado em CSDN - Conselho Superior de Defesa Nacional, depois de passar pela Assembleia da República.

Verificou-se desde logo que as componentes não militares da Defesa não merecia o cuidado indispensável dos responsáveis sectoriais do Governo. Foi, ao longo dos anos, uma luta difícil e com pouco sucesso. O CEDN de 1985 foi marcado pelo período da Guerra Fria e pelo seu enquadramento na NATO; no CEDN de 1994 já se fizeram sentir as consequências da queda do Muro de Berlim, da implosão da URSS, do Tratado de Maastrich, do novo Conceito Estratégico da NATO (1991), das Operações de Apoio à Paz e das hipóteses do terrorismo internacional; o de 2003 foi naturalmente influenciado pelo emergir catastrófico do terrorismo transnacional (marcado pelo 11 de Setembro), pelo assumir da Segurança e Defesa pela União Europeia, pelos conflitos regionais e pelo novo Conceito Estratégico da NATO de 1999 (poder actuar antes de tempo e fora de área). Pela primeira vez, e pela voz do Dr. João Salgueiro, surgiu a proposta de um Conceito Estratégico de Afirmação Nacional. Mas a questão da falta de envolvimento sério com as componentes não militares da Defesa foi sempre continuando.

Entretanto, perante o avolumar e a alteração qualitativa das ameaças e vulnerabilidades, os especialistas foram chamando a atenção para que tal conceito necessitava de ser mais alargado, devendo incluir também a Segurança Interna; assim deveria passar a chamar-se CESD - Conceito Estratégico de Segurança e Defesa ou CESN - Conceito Estratégico de Segurança Nacional, o que veio finalmente a ser aceite pelos responsáveis políticos, solução adoptada também por alguns dos nossos aliados na NATO. Está agora novamente em desenvolvimento o trabalho que nos leva ao CESD ou CESN de 2012.

O trabalho tem sido desenvolvido com grande seriedade, primeiro pelo IDN - Instituto de Defesa Nacional e agora alargado a um grupo multidisciplinar de entidades seleccionadas pela sua competência. Também, como em 2003 (pela primeira vez), tem-se procurado envolver a população nesta discussão que é do interesse de todos. Ocorre que continuam a existir problemas muito concretos. O CESD/CESN tem de ser assumido pelo Primeiro Ministro, pois o MDN não tem poderes para fazer os seus colegas do Governo cumprirem as decisões tomadas na sua área de responsabilidade. Mas continuamos atrasados, já que deveria existir um CEN -Conceito Estratégico Nacional, mais lato que qualquer dos anteriores modelos; este, sendo plurianual (cerca de 10 anos), daria as grandes linhas permanentes onde se iriam integrar os sucessivos Programas de Governo. As questões essenciais da vida nacional estariam assim balizadas, evitando soluções de mudança de Governo, conjunturais, eleitoralistas, improvisações influenciadas por grupos de pressão, etc.. Haveria maior responsabilização, continuidade e possibilidades de controlo.

Se esta é, para muitos especialistas, a solução ideal, já a sua concretização teria muitas dificuldades, pois os Governos (saídos da lógica partidária) podem querer evitar tal compromisso, embora de interesse nacional, e mesmo eventualmente concordando, podem ter muitas dificuldades em a concretizar, pois os interesses nacionais podem já estar subordinados a limitações, de várias origens, impostas pelo exterior. Este é um drama antigo em Portugal, mas há que saber jogar com o ambiente internacional. Verdadeiramente, o que nos interessaria seria um Conceito Estratégico Nacional pela sua abrangência. Qualquer que seja a solução, o novo CESD/CESN/CEN (e há a necessidade de se perceber que se tratam de três patamares diferentes, de três concepções progressivamente alargadas e enriquecidas nas suas obrigações e necessidades) pode ser um trabalho de grande qualidade, mas que, mais uma vez, pode ficar no papel.

Pode apenas ser um registo de boas intenções; oxalá, eu esteja enganado.

Lisboa, 11 de Outubro de 2012.

domingo, 25 de novembro de 2012

A IRRELEVÂNCIA DOS ELOGIOS: um artigo de Jorge Marques.

 

por Jorge Marques (Este texto representa apenas o ponto de vista do autor, não da PASC, nem das associações que a compõem).

 

 

A Universidade de Harvard fez há uns anos atrás um estudo sobre o impacto das críticas negativas e dos elogios na melhoria dos desempenhos das pessoas e das organizações. O resultado contrariou um pouco o senso comum de que o elogio ou a crítica aumentavam ou diminuíam as motivações e por consequência os resultados do trabalho. Aquilo que veio a verificar-se como sendo verdadeiramente motivador, era o facto de se estabelecerem metas, ou seja, objectivos de curto prazo. Era essa perspectiva de um futuro próximo que gerava a energia necessária para se realizar, para se empreender, para se atingir essa meta.

Foi aqui que me lembrei dos ciclistas que, depois de algumas centenas de quilómetros nas pernas, perfeitamente desgastados, ainda encontram uma força mágica para o sprint final, mal visualizam o cartaz que diz META. Isto parecia confirmar-me a teoria de Harvard!

Entre nós, nestes tempos difíceis, estamos a fazer um enorme esforço para contrariar esta teoria e como que a tentar dar a volta a Mark Twain quando dizia que entre a ficção e a realidade havia apenas uma questão de credibilidade. O que se passa afinal?

  • O Governo, perante uma rejeição total das suas políticas, em boa parte vinda de dentro da própria família, contrata umas agências de comunicação para difundir elogios a si mesmo. Outras vezes e no mesmo dia, aparecem os banqueiros a elogiar as medidas do governo, terão as suas razões;
  • Mas estes gestos não se ficam pela política caseira, estes elogios partem também de algumas instâncias europeias, de onde Gaspar é funcionário e onde regressará um dia. Também o FMI, através do etíope Selassié quer agarrar-se a Passos e Gaspar na expectativa de que pela primeira vez esta organização tenha um sucesso e depois das múltiplas e erradas intervenções pelo mundo fora. E a melhor solução que encontraram foi elogiar o Governo e Gaspar.

Em ambos os casos, trata-se daquele exercício de que fala Mark Twain, tentar tornar real uma ficção, mas que se perde na falta de credibilidade.

Em ambos os casos esses elogios não motivam, nem provocarão melhores resultados, para isso precisamos de metas como nos dizem de Harvard.

Não acertam uma!

sexta-feira, 23 de novembro de 2012

EM DEFESA DE UM PLANO DE ESTÍMULOS PARA UMA "ECONOMIA VERDE": um artigo de Rui Martins.


por Rui Martins (Este texto representa apenas o ponto de vista do autor, não da PASC, nem das associações que a compõem).


 
Portugal não vai sair da atual Depressão Económica sem que seja aplicado um intenso, decidido e bem orientado programa de estímulos e incentivos económicos. Em Portugal não podemos mais correr o risco de desperdiçar tempo ou dinheiro. Já gastámos tempo suficiente nos últimos vinte e cinco anos, ora culpando o “pai” (Salazar, o Antigo Regime ou a Inquisição), ora culpando o "padrasto" (a União Europeia, a Europa, a Globalização ou o Neoliberalismo). Não negamos a influência determinante desse fatores no nosso subdesenvolvimento crónico, mas chegou a altura de vencer esse complexo de adolescência (anacrónico, num país com mil anos de existência) e pegarmos o nosso próprio destino coletivo nas mãos. Já o escrevi várias vezes e, correndo o risco de me tornar repetitivo, vou tornar a regressar ao assunto: Portugal não vai sair da atual Depressão económica sem que seja aplicado um intenso, decidido e bem orientado programa de estímulos e incentivos económicos.

Não podemos, não devemos, continuar a aplicar camada sobre camada de tapetes de austeridade, esmagando cada vez mais a economia nacional com impostos desproporcionados, com um Estado opressivo e disfuncional (porque centralizado e sequestrado pela partidocracia) e com estratégias nacionais corrosivas que, servindo os interesses dos credores internacionais e dos países do norte da Europa (na estafada lógica Cavaquista do “bom aluno”), prejudicam seriamente o país e a sua capacidade para construir uma sociedade livre, dinâmica e próspera. Não busquemos lições ou conselhos no exterior. Saibamos dar o nosso próprio “Grito do Ipiranga” e declaremos a soberania nacional contra esses interesses externos que nos querem reger (e que hoje, efetivamente, nos governam em regime de “protetorado dos credores” = Troika).

Portugal tem de partir, simultaneamente, por duas vias: na limpeza de balanço, declarando bancarrota parcial e recusando pagar a dívida imoral que décadas de irresponsabilidades e demissão popular dos deveres de vigilância e sufrágio deixaram instalar e implementar um plano nacional de estímulo económico que, centrado em dois eixos, o Mar e a Economia Verde, nos permita reconstruir o tecido produtivo e adquirir a soberania económica que deixámos transferir para fora das nossas fronteiras em troca de uma aparente riqueza e prosperidade.

Já discorremos amplamente, noutros artigos, sobre a necessidade de erguer uma política nacional do Mar, com estímulos financeiros e económicos à génese e desenvolvimento das atividades tradicionais a si ligadas (pesca, portos, construção naval, transportes marítimos) e de atividades ditas de “terceira geração” (aquacultura, energia offshore, portos de transbordo offshore, recursos minerais, etc.).

Mas, num país tão dependente das importações de energia, tão descarnado de atividades produtivas do setor primário, há que complementar essa abordagem de um estímulo marítimo com um igualmente audaz plano de promoção duma “Economia Verde” que nos liberte do jugo das importações de petróleo, de gás e de energia elétrica de Espanha e França.

O bom trabalho desenvolvido no tempo do Socratismo tem que ser continuado, desta feita em termos mais sustentáveis e sem favorecer os “grandes interesses” (protagonizados hoje pela chinesa EDP e pela espanhola Endesa), mas promovendo a “auto-geração” por parte de pequenos e médios produtores nacionais e transferindo para estes os escandalosos subsídios estatais às grandes multinacionais do ramo, as tão criticadas “rendas excessivas” que a todos nos oprimem.

As descentralização, multiplicação e promoção de produção elétrica autónoma, sustentável e renovável, deve ser estimulada, permitindo que este programa chegue não a um pequeno grupo de empresas multinacionais estrangeiras, mas a um amplo leque de cidadãos, empreendedores e dinâmicos, capazes de entregar ao país a soberania energética que este nunca teve e de simultaneamente alavancar o desenvolvimento de uma indústria e ciência na área das energias renováveis realmente nacionais.

Em simultâneo, os transportes (públicos e particulares) devem ser alvo de um plano correspondente: promovendo transportes públicos baratos, amplamente disponíveis e ecologicamente sustentáveis.

Complementarmente, a extensão da já existente rede de tratamento de resíduos e do seu reaproveitamento e, sobretudo, um plano de incentivos fiscais (IVA e IRS) à realização de obras que melhorassem os isolamento térmico e rendimento energético de milhões de habitações em Portugal. Além de dinamizar o dormente setor da construção, o maior gerador de desemprego em Portugal, estas obras dinamizariam os meios locais, não em grandes (e caras) obras “hidráulicas”, mas numa multidão de pequenos melhoramentos que beneficiariam dezenas de pequenas e médias empresas, em vez de uma quantas grandes empresas do setor.

Uma projeção recente, feita pela OIT para Espanha, estima que se o país vizinho conseguisse gerar até 20% da sua energia por fontes renováveis, seriam por isso criados mais de vinte de 120 mil novos empregos, isto em menos de oito anos. A construção de uma rede elétrica, para uso de veículos de transporte adaptados, originaria por sua vez outros 770 mil empregos. A OIT faz um projeção idêntica quanto à reabilitação do rendimento energético das habitações (a maior fonte de desperdício energético em Portugal), estimando que a reabilitação de 25 milhões de habitações criaria mais de 1.3 milhões de empregos. A gestão de resíduos, por sua vez, criaria cerca de 30 mil empregos até 2016. O estudo não inclui Portugal, mas não é difícil ampliar estas conclusões e estimar que existe na aplicação de um “Plano de Estímulos para uma Economia Verde” - a decorrer nessas várias frentes: Energias Renováveis, Mar, Resíduos, Transportes Sustentáveis e Eficiência Energética - um forte impulso à economia nacional, alavancando a sua saída desta asfixiante depressão, quebrando o ciclo infinito de austeridade-depressão em que agora estamos imersos.

GOVERNAÇÃO ABERTA, UMA FORMA ALTERNATIVA DE GOVERNAÇÃO PARA OS ESTADOS, AUTARQUIAS E PARTIDOS POLÍTICOS: um artigo de Rui Martins.


por Rui Martins (Este texto representa apenas o ponto de vista do autor, não da PASC, nem das associações que a compõem).

 


A Governação Aberta (em inglês, Open-Source Governance) é uma filosofia política que defende a aplicação à política das mesmas filosofias inventadas e desenvolvidas pelos movimentos de Software Livre, que nos meios da Internet e das Ciências da Computação deram origem a sucessos como o Mozilla Firefox, o Linux, o MySQL ou o Apache. Emulando as filosofias destes movimentos, esta nova forma de fazer política permite que os cidadãos participem no processo de criação de novas políticas ou na alteração de políticas existentes da mesma forma que qualquer cibernauta pode participar numa página wiki, por exemplo na Wikipedia ou em qualquer plataforma que suporte este formato. Desta forma, o processo legislativo fica aberto aos cidadãos, aplicando-se o princípio do crowdsourcing (a “sabedoria das multidões”), que hoje começa a demonstrar o seu valor em muitos projetos empresariais. No processo, ficamos com uma democracia mais dinâmica e aberta.

Existem várias interpretações sobre como se pode transpôr este conceito para a realidade. Nas próximas linhas iremos apresentar a nossa própria interpretação do termo “Governação Aberta”:

  1. Uso de ferramentas colaborativas · Algumas ferramentas colaborativas (como o IdeaScale, onde criámos a comunidade OpenPortugal) permitem a submissão de ideias, votar nas mesmas e adicionar comentários. Para submeter ideias basta escolher um título, dar uma breve descrição e escolher uma campanha (finanças, segurança social, empresas, etc.). Depois de submetida, a ideia fica disponível para receber votos positivos ou negativos e regularmente são enviados relatórios por email a todos os participantes de cada grupo. Um sistema deste tipo, implementado com um peso relativo (por exemplo, reservando um peso global de 20% na votação parlamentar), poderia democratizar a tomada de decisões políticas, abrindo à sociedade civil os claustros legislativos, hoje monopólio exclusivo de uma reduzida clique partidocrática.
  1. Site Wiki · Criar um site Wiki, devidamente moderado, organizado por seções abertas a quem na Sociedade Civil estivesse capacitado ou certificado para produzir opiniões informadas e de qualidade (dirigentes associativos, académicos, investigadores universitários, autores com um certo número de edições vendidas, etc.). Esta “Wikipedia do processo legislativo” seria uma ferramenta importante para abrir à sociedade civil o processo legislativo e melhorar a qualidade da vida democrática nacional.
    • A vida interna dos partidos políticos poderia beneficiar da utilização de  mecanismos de votação como o IdeaScale e de páginas Wiki para a elaboração de propostas e alternativas de governação. Um partido que incorporasse formas de governação aberta seria uma espécie de entidade coletiva, regida por referendo online, algo que não foi ainda ensaiado em grande escala, mas que encerra em si a promessa de uma revolução na participação democrática na vida dos partidos e de dinamização das dormentes sociedades civis da atualidade. Um tal modelo de governação interna dos partidos poderia, inclusivamente, ser aberto a simpatizantes e cidadãos não identificados com nenhum partido, ampliando o papel da sociedade civil na elaboração de novas políticas e cativando novos elementos para o seio da organização com esta política de completa transparência e abertura cidadã.
    • Wikis avançadas · O modelo clássico de um site Wiki pode não ser suficientemente elaborado para permitir a sua utilização no contexto de uma Governação Aberta. Assim, um sistema Wiki aberto como o modelo convencional, mas incorporando tags semânticas, diferentes níveis hierárquicos de controlo de conteúdos e scoring de editores e moderadores, pode ser exigido numa segunda fase, mais madura, da implementação de Wikis para a produção de Legislação ou de Propostas Políticas.
  1. Distribuições Locais · Desde há muitos anos que defendemos o modelo da Regionalização Municipalista como forma alternativa de Regionalismo e como cura radical para o problema do Centralismo que bloqueia desde há décadas o nosso desenvolvimento. Neste modelo de descentralização administrativa e democrática, o estabelecimento de um quadro legislativo local surge naturalmente em posição de destaque, mas o problema de a partir de um dado momento termos uma multidão de quadros legislativos fragmentários ou incompatíveis impõe-se. Num modelo tão descentralista como aquele que advogamos (e que busca a sua inspiração direta na proposta agostiniana de tornar Portugal numa “federação de municípios independentes”), a produção de Leis Locais, provenientes das Leis Nacionais, mas sempre compatíveis num quadro constitucional comum, é fundamental e encontra no modelo de “Distribuição Wiki” a sua solução. À semelhança das distribuições de Linux, um quadro normativo comum, com leis e normas municipais, seria distribuído e atualizado regularmente. Depois, os municípios, por processos democráticos, abertos e colaborativos,  adaptá-lo-iam às suas necessidades e idiossincrasias locais. Obviamente, apenas uma percentagem dessas leis “distribuídas” seria efetivamente alterada e aquela que o fosse sê-lo-ia de forma apenas parcial.

Conclusão · a implementação de mecanismos de Governação Aberta ao nível de um Estado, uma Autarquia, um Partido Político ou uma Associação, apresenta várias vantagens: aumenta de forma radical a quantidade de pessoas que tomam parte no processo de definição de posições e através de técnicas de crowdsourcing pode aumentar a qualidade destas posições ou do próprio processo legislativo. A Governação Aberta é uma forma de democracia direta, adaptada aos tempos digitais e de acesso ubíquo à Internet, ampliando o espaço de participação e deliberação, que encerra em si mesma a promessa de vivificação e dinamização de uma Sociedade Civil entorpecida e sequestrada pelos Interesses que se movem em torno da partidocracia.

Partidocracia essa que, nas democracias ocidentais, repele números crescentes de cidadãos de uma vida cívica ativa e plena, permitindo assim que pequenas castas familiares de “políticos profissionais” prosperem, usando e sendo usados pelos Media e pelos Grandes Interesses, que governam, efetivamente, na sua sombra.

quinta-feira, 22 de novembro de 2012

DESEMPREGO E DIÁLOGO ENTRE GERAÇÕES: uma síntese do XII Encontro Público PASC, por Jorge Marques.
























 

Questões de fundo



O futuro profissional vai depender da capacidade individual e colectiva para criar valor. As aptidões e as competências têm que ser as mais procuradas e, destas, as melhores.

Esta realidade condiciona uma mudança de fundo na cultura de trabalho e que é a de passarmos de generalistas superficiais, ou seja, saber pouco de muita coisa, para sermos especialistas em série, que significa conhecimento profundo e competências em várias áreas.

A especialização em série consiste em aprofundar e escolher carreiras e competências que estarão em alta nos próximos vinte anos criando condições para sermos um centro de talentos globais.

Esta é uma tarefa difícil porque, ao longo de muitos anos, essa especialização, esse conhecimento profundo, e os papéis do aprendiz e do especialista, foram completamente desvalorizados.

Querem um desses maus exemplos, neste caso promovido pelas Universidades? Porque atribuímos o grau de Mestre a alguém que nem sequer ainda foi aprendiz? Porque estamos uma vez mais a valorizar competências superficiais e generalistas, quando ser Mestre significa conhecimento profundo, significa saber fazer, saber transmitir e liderar!

Mas não! Ficamos satisfeitos por produzir coordenadores, chefes, directores, directores gerais, títulos e estatutos… ignorando que num mercado global isso de pouco vale, porque não acrescenta valor.

Em 2004, cerca de 40% da população activa dos EUA trabalhava em pequenas empresas, 47% no Reino Unido… e na Europa o número é semelhante. Isto quer dizer que as grandes empresas vão acabar? Claro que não, elas vão ser ainda mais e maiores, só que terão a trabalhar para elas, gente por conta própria, pequenos grupos organizados, pequenas oficinas, micro-empresas.

Provavelmente, o emprego será substituído por uma espécie de ecossistemas que serão parte integrante dele. Já não contrataremos horas, férias, regimes de trabalho, reformas, mas produtos ou serviços que serão incorporados com maior ou menor dimensão para criar mais valor.

Então e o que vai acontecer ao talento, à nossa criatividade, aos criativos?

Vamos ser remunerados?

Aquilo que se conhece hoje é uma percentagem curiosa, onde 80% terá um rendimento baixo, mas não serão infelizes, porque trabalharão naquilo que gostam, 18% viverá bem e 2% acertarão no jackpot e terão remunerações de vedetas.

Mas para se ser especialista competitivo tem que se aprofundar conhecimento, tem que se gostar do que se faz, tem que se encontrar significado no trabalho.

Há hoje grandes defensores de que temos que regressar a um espírito anterior à Revolução Industrial, ao aperfeiçoamento de um ofício, pensar como um artífice e ter prazer no que se faz.

Eu sou dos que acreditam de que no futuro do emprego está um tipo de trabalho feito como se de uma Arte ou Ofício se tratasse, uma pequena oficina onde se trabalha directamente para um cliente, para uma rede ou para uma grande empresa, para as empresas globais.

E o que é que esta ideia do diálogo inter-geracional faz aqui? E o que tem a ver com o emprego ou com o trabalho?

Porque num Mundo de Trabalho que se constrói com base nos especialistas, no conhecimento profundo, temos que procurar os verdadeiros Mestres, aqueles que sabem fazer e sabem transmitir, temos que nos assumir como aprendizes.

SOCIEDADE DIGITAL E DO CONHECIMENTO: uma iniciativa das APG e APDSI Norte.


segunda-feira, 19 de novembro de 2012

DESEMPREGO E DIÁLOGO ENTRE GERAÇÕES: um apontamento de João Salgueiro no XII Encontro Público PASC.

























«É importante ver a vida a três dimensões e nela desenharmos os respectivos projectos:

  1. Um projecto de vida, o que queremos da vida no seu todo, onde envolvemos família, amigos, interesses, a procura de uma felicidade;
  1. Um projecto profissional, onde envolvemos a escola, as competências profissionais, as capacidades, as empresas e organizações;
  1. Um projecto de cidadania, onde temos um papel a cumprir e a partilhar em função da comunidade e do bem comum.

A vida tem estas três componentes e temos que saber viver nestas três dimensões. Sem isso, alguma coisa ficará incompleta, vazia. No que diz respeito à cidadania, está bem de perceber como o país precisa do nosso envolvimento!»

sábado, 17 de novembro de 2012

BANKSTERS: um artigo de Rui Martins.


por Rui Martins (Este texto representa apenas o ponto de vista do autor, não da PASC, nem das associações que a compõem).

 

Não há dúvidas de que os acontecimentos dos últimos anos têm colocado a Banca e, sobretudo, os seus gestores como o exemplo mais consumado de maldade corporativa. Responsáveis em grande medida pela grave crise financeira que hoje ecoa pelo mundo e que nos coloca a todos na beira de uma segunda Grande Depressão de duração e extensão ainda impossíveis de antever, a Banca e os Banqueiros representam hoje todo o Mal que existe latente no sistema capitalista. Apesar de ser nas palavras de Agostinho da Silva o “melhor dos sistemas possíveis”, somente boa e ativa regulação, uma classe política independente e uma população vigilante podem moderar.

A sucessão interminável de crimes, pura má gestão ou ambição desmedida por parte dos banqueiros expõe uma sociedade moralmente doente, dominada pelo lucro fácil e embriagada em prémios milionários e na segurança absoluta de quem “faça o que fizer será salvo pelo Estado”, estando o seu próprio traseiro seguro por cláusulas de rescisão generosas e juridicamente blindadas.

Que doença moral é esta de que padecem os banqueiros? Que passividade criminosa é esta dos políticos (e das populações que os elegem) que toleram esta amoralidade da Banca? Que impunidade cúmplice é esta por parte dos órgãos de Justiça? Que poder estranho e absoluto é este que o “Banco dos Bancos”, o Banco JP Morgan detém sobre os países do G20 e que tem permitido bloquear todas as tentativas de regular o caos financeiro que rege os Mercados e que está na base daquela que cada vez se parece mais com uma segunda Grande Depressão?

terça-feira, 6 de novembro de 2012

DESEMPREGO E DIÁLOGO ENTRE GERAÇÕES: documento enquadrador do XII Encontro Público PASC · Instituto Superior de Ciências Sociais e Políticas - Pólo do Alto da Ajuda em Lisboa · 13 de Novembro de 2012 · 14:45 - 17:00.




 

 

 

 

   

 

 

 

 

 

 

A PASC – Plataforma Ativa da Sociedade Civil, surgiu em Janeiro de 2010. Resultou da reunião de um grupo de Associações Cívicas numa plataforma informal. Esta plataforma adoptou como um dos seus objectivos, o de dinamizar o contributo da Sociedade Civil para a mudança necessária face à crise financeira, económica, e sobretudo social que já era visível em Portugal.


Hoje, com o contributo de 27 Associações, a missão da PASC continua a ser a de dar expressão a questões de interesse nacional, fazendo apelo à mobilização e consciencialização dos portugueses para uma cidadania ativa e responsável, individual e coletiva.


 

Enquadramento



O desemprego, os níveis a que chegou, a terrível rapidez com que cresce, atingindo toda a Sociedade, em termos de idade, género e qualificação profissional, tem que ser uma prioridade em qualquer Agenda Política, em particular nas agendas políticas de Estados Democráticos como Portugal.

Mas não está a ser!

O desemprego tem que ser igualmente tema prioritário para um debate promovido por uma Sociedade Civil responsável e activa. Uma sociedade que dê voz aos desempregados e aos seus anseios. O desemprego em Portugal é por isso uma das Causas que a PASC abraçou.

A PASC propõe-se levar a cabo várias acções que contribuam, através do Debate Público, para uma mudança de atitude do Governo face ao desemprego e aos desempregados.

Este XII Encontro Público PASC – “Desemprego e Diálogo entre Gerações” insere-se nessa linha de acção da PASC.

As economias e as sociedades tenderão para serem sociedades de não emprego.

A ideia de que o crescimento económico vai absorver o actual desemprego é uma não verdade que importa desmistificar para que nos centremos na procura de novas soluções.

As soluções para o desemprego têm que ser encontradas nos domínios da vontade política e da Inovação Social.

É necessária uma urgente e profunda alteração dos actuais modelos, quer do emprego, quer da relação de trabalho. A palavra de ordem é Inovação Social porque esta trará novas formas de Contrato Social.

É necessário encontrar o valor acrescentado naqueles que, actualmente, parecem ser dois dos pontos críticos do mercado de emprego, a entrada e a saída do mesmo. Neles cruzam-se a energia da juventude com o conhecimento e a experiência dos maiores.

Estudos realizados quer a nível europeu, quer a nível mundial, apontam como desafios cruciais ao mundo do trabalho e à gestão das empresas a Gestão do Talento e a Transmissão do Conhecimento entre das gerações.

Face aos dados referidos e a um Mundo Ocidental, em particular a um País, com cada vez menos emprego, pretendemos discutir neste Encontro as respostas às seguintes questões:

  • Poderemos criar formas alternativas ao emprego tradicional que sejam simultaneamente a concretização do potencial individual e geradoras de inovação, equilíbrio e riqueza?
  • Poderemos desenvolver novas relações de trabalho neste cenário de emergência?
  • Que tipo de soluções para potenciar o encontro da energia e da nova informação dos mais jovens com o conhecimento e experiência dos maiores? Que tipo de flexibilidades, de partilhas, de empreendedorismo entre estes grupos?
  • No momento que Portugal atravessa, com cerca de 17% da população activa no desemprego, sendo que esta percentagem ultrapassa os 35% quando nos cingimos a uma população com menos de 35 anos, é este debate útil? É possível implementar soluções alternativas? Quais os pressupostos a cumprir?

 

 

Programa



14:45
Abertura
Maria Perpétua Rocha · Coordenadora da PASC; Jorge Marques · Presidente da Assembleia Geral da APG; João Salgueiro · Economista, Professor Universitário

15:30
Oportunidade 2020

15:45
Apresentação de depoimentos filmados de várias personalidades europeias e Ana Margarida Silva da EURES (Plataforma Europeia de Emprego)

sábado, 3 de novembro de 2012

A VERDADEIRA REFUNDAÇÃO DE PORTUGAL - MAIS DEMOCRACIA E MAIS LUSOFONIA: um artigo de Renato Epifânio.


por Renato Epifânio (Este texto representa apenas o ponto de vista do autor, não da PASC, nem das associações que a compõem).



É sempre o mais fácil: culpar os outros, em vez de apurar as nossas próprias responsabilidades. Neste grave crise estrutural que Portugal atravessa, uma das maiores da nossa história, também isso tem acontecido: tendemos a culpar tudo e todos, excepto nós próprios.

É certo que as responsabilidades desta crise não são igualmente partilháveis – longe disso: há pessoas que são (muito) mais e (muito) menos responsáveis. Mas, em última instância, todos temos alguma dose de responsabilidade. De nada nos vale, pois, por exemplo, como tem sido comum, culpar a “classe política”: fomos nós que a elegemos. E de pouco vale dizer que não havia alternativa: poderíamos sempre ter optado, em última instância, pelo voto em branco.
 
Não há liberdade que dure sem responsabilidade. Finalmente, parece que estamos a perceber isso. E daí a vontade expressa de muita gente em ter uma atitude mais responsável na condução deste país, na definição do nosso futuro colectivo. Se chegámos onde chegámos, foi também pela indiferença, pela omissão, de muitos portugueses. De muitos de nós.

É certo que muitas vezes essa vontade é, em grande medida, inconsequente: expressa-se em manifestações que se afirmam quase que apenas pela negativa. É por isso que, em geral, no dia seguinte, tudo continua mais ou menos, senão inteiramente, na mesma. Mas é já um bom sintoma: essa vontade, esse empenhamento. Resta agora que cada um de nós encontre as plataformas cívicas e políticas que melhor se adequam às suas expectativas. E que, sobretudo, proponham reais alternativas de futuro. Não basta dizer “não”.

O futuro de Portugal passará pois, necessariamente, por “mais Democracia” – ou seja, por um muito maior empenhamento cívico e político de todos nós. Isso levará, naturalmente, à regeneração dos partidos existentes, à criação de novos partidos e, idealmente, à possibilidade de candidaturas independentes a diversos órgãos – desde logo, à Assembleia da República. Não poderá ficar tudo como dantes. Não temos mais desculpa para continuarmos a culpar a classe política que nós próprios elegemos. Acabou-se o tempo das desculpas.

“Mais Democracia”, porém, sendo fundamental, não basta. Como diriam, os latinos, é preciso uma solução ad intra e ad extra, ou seja, “para dentro” e “para fora”. Para dentro, esse parece-nos ser o grande desígnio: “mais Democracia”. Para fora, porém, há um outro, não menos importante: “mais Lusofonia”. Só assim corrigiremos o maio erro estratégico que cometemos nestas últimas décadas – aquele que, de resto, melhor explica a situação internacional a que chegámos: termos desprezado o espaço lusófono, apostando tudo na integração europeia. Entendamo-nos: o nosso erro não foi propriamente termos aderido à então Comunidade Económica Europeia. Foi, antes, termo-lo feito numa posição de fraqueza.

Se, com efeito, Portugal sempre tivesse promovido os laços com os restantes países e regiões do espaço lusófono, teria hoje, mesmo no espaço da moeda única europeia, uma posição bem mais fortalecida. Agora, porventura, já será tarde. A História não volta atrás. Seja como for, Portugal terá sempre futuro e terá tanto mais futuro quanto mais assumir esse desígnio estratégico: “mais Lusofonia”. Quer mantenhamos a nossa adesão à moeda única europeia, quer venhamos a ter que sair – cenário cada vez mais plausível, dado o bloqueio económico a que chegámos –, “mais Lusofonia” significará sempre, para Portugal, mais Futuro.

quinta-feira, 1 de novembro de 2012

A PROPÓSITO DA REFUNDAÇÃO: um artigo de Jorge Marques.


por Jorge Marques (Este texto representa apenas o ponto de vista do autor, não da PASC, nem das associações que a compõem).

 

 

Desde o primeiro dia da governação, o actual executivo tinha fundamentalmente três grandes objectivos estratégicos e que eram a gestão do memorando com a Troika, o crescimento económico e a reforma do Estado.

Mas eram três grandes objectivos para serem trabalhados em simultâneo e para serem agarrados por figuras de peso político e com capacidade de gestão e liderança, independentemente do que lhes quisessem chamar.

A opção do governo, diga-se em boa verdade, foi a de se concentrar apenas no memorando, arrastando consigo todos os ministros e toda a governação. De facto é muito mais fácil lançar impostos atrás de impostos do que promover forças e energias para atrair investimentos e para fazer crescer aqueles que já existiam. É muito mais fácil querer arrumar a casa dos outros do que a própria casa. Estou em crer que a opção do governo não foi uma escolha consciente, nem baseada em qualquer tipo de conhecimento ou ideologia, mas apenas o resultado de muita incapacidade e ausência de competências. O governo não tinha sequer uma visão e muito menos uma estratégia.

No meio deste desnorte, o ministro das finanças balbucia a descoberta da pólvora, os portugueses querem demais para aquilo que pagam e logo a seguir o seu discípulo, qual Afonso Henriques, aparece com a bandeira da refundação.
Qual é, quanto a mim, o problema que gira á volta deste conceito?

A ideia de que existe um Estado como Instituição Soberana para o exterior e organizada hierarquicamente para o interior, já não é uma imagem nem real, nem possível.

O Estado enquanto forma heróica envelheceu; enquanto garante do bem comum está em sobrecarga e já não pode garantir nada; enquanto benfeitor da sociedade já não tem recursos suficientes e enquanto Centro de Governo já só é mais um centro no meio de muitos outros.

Neste contexto o Estado precisa reflectir, mas muito rapidamente, sobre o seguinte:

  • o mundo, o país, todos os sistemas, tornaram-se demasiado complexos e já não podem ser liderados por um vértice hierárquico onde temos colocado os governos;
  • o país não pode viver ao ritmo da Constituição, do Parlamento, nem da Máquina do Estado, o ritmo do tempo real já é outro;
  • perante o reconhecimento da sua incapacidade para gerir tudo, o Estado tem que optar entre a gestão da burocracia, das rotinas, do agora, dos pequenos conflitos de interesses ou o de ser um centro dinâmico que gera a energia e facilita a vida de todos os outros centros. O Estado tem por isso que optar por competências nucleares, emagrecer e reduzir substancialmente todas as tarefas que não comportam qualquer valor;
  • nesta linha de pensamento, o falar em refundar é só mais uma das variantes para não se fazer nada, ou mudar para que tudo fique na mesma; o que o Estado tem que fazer, é o de rever a sua missão, os seus objectivos, as suas tarefas e aquilo que lhe compete e não compete e quem e como o vai ajudar no resto;
  • a estrutura do Governo não está à altura dos desafios de todos os outros sistemas sociais, economia, meios de comunicação, tecnologia, ciência, educação, porque estes precisam ganhar flexibilidade, autonomia e saber funcionar com interdependência. Nós não precisamos propriamente de Ministérios e de Ministros para ocuparem pastas, isso é arcaico, do que precisamos é de centros de competências e de pessoas competentes para pensar e executar da melhor forma. O Governo, enquanto entidade política, deve reservar-se para missões mais nobres, deve exercer sobretudo competências de coordenação e mediação dos Sistemas Sociais. Mas não é só o governo que precisa mudar radicalmente, é todo o Sistema Político e a pesada máquina que o suporta.

Com tudo isto, queremos dizer que também não é verdade que haja uma crise da política, muito menos que ela se esgotou, o que acabou foi uma certa forma de fazer política e que nos conduziu até aqui.

Uma nova política não tem donos, nem pode continuar a ser monopólio dos partidos políticos, ela deverá ser a essência da vida de uma Sociedade Civil madura, comprometida e inteligente…o que temos agora pela frente é muita coisa para pensar e resolver e onde todos seremos poucos. Dessa forma, também o sistema será mais eficaz e muito mais barato.

quarta-feira, 31 de outubro de 2012

OS BONS ALUNOS DAS MÁS ESCOLAS: um artigo de Jorge Marques.


por Jorge Marques (Este texto representa apenas o ponto de vista do autor, não da PASC, nem das associações que a compõem).


 
Não é a primeira vez que ouvimos falar da teoria do bom aluno na história das nossas governações. Aconteceu com Cavaco quando a troco de alguns milhões destruiu o nosso aparelho produtivo e deixámos de produzir o que quer que fosse. Acontece com Passos Coelho neste acerto de contas com os nossos credores a troco da sua sobrevivência política e da carreira de Gaspar.

Nos dois casos existe um traço comum, é que as escolas destes dois bons alunos, são más na sua essência.

A escola de Cavaco tem os resultados à vista e é em boa parte a responsável pela dificuldade do pagamento da nossa dívida, pelo desemprego que atingimos e pela perda de uma ideia de futuro. De tal maneira, que ainda na semana passada, num bom seminário que se realizou em Lisboa, a urgência da Europa volta a ser a reindustrialização, que foi coisa que alguns países nunca abandonaram. Cavaco preferiu o dinheiro fácil ao acto difícil de governar, preferiu a teoria do oásis à teoria do verdadeiro e sustentado crescimento. Por todas essas opções, foi reconhecido como um bom aluno, primeiro por aqueles que sabiam o que viria a acontecer e que são hoje os nossos credores e depois pelos eleitores portugueses que o colocaram na Presidência da República. Claro que hoje não se pode pedir muito a Cavaco, porque a maior parte do que nos está a acontecer tem origem nos graves erros que cometeu. E tudo porque se quis ser, nessa altura, um bom aluno!

Com Passos Coelho, as circunstâncias têm algumas semelhanças, porque mais uma vez a opção é o desistir de uma governação difícil e optar por ser um bom aluno, aluno dos nossos credores. Uma vez mais o governo quer receber os milhões de um dinheiro aparentemente fácil, porque quando se vier a constatar que tudo isto são erros atrás de erros, já o Primeiro Ministro e o seu Mestre estarão a milhas e a mesma discussão entre nós continuará igual a si mesma. Gaspar é um quadro do Banco Central Europeu, um dos nossos credores, será ali que continuará a fazer a sua carreira quando sair do governo, é um bom aluno dessa instituição, é ali que está o seu futuro pessoal e profissional. O país não escolheu por isso um Ministro das Finanças, mas um controller dos nossos credores, não escolheu quem nos defendesse nas instâncias europeias e explicasse bem a situação para além dos números, mas apenas um bom aluno, porque as agências de comunicação haveriam de lhe dar uma nova imagem de competência acima de qualquer suspeita.

Fernando Pessoa dizia, e eu acho que ele tinha razão, que Portugal precisa de um indisciplinador, estamos fartos de bons alunos…

segunda-feira, 29 de outubro de 2012

PORTUGAL, AS GRANDES IDEOLOGIAS E O TITANIC: um artigo de José Eduardo Garcia Leandro.


por José Eduardo Garcia Leandro (Este texto representa apenas o ponto de vista do autor, não da PASC, nem das associações que a compõem). 

 


O mundo tem sempre avançado à custa das idéias e da evolução da ciência; durante séculos com grande lentidão na economia, regimes autoritários, poderes religiosos dominadores, impérios expansionistas e a procura de novas fronteiras na terra e no mar.

Com a Revolução Francesa e a I Revolução Industrial tudo mudou; o sistema de produção alterou-se surgindo os primeiros grandes capitalistas e uma imensidão de trabalhadores proletários.

A partir daí (meados do século XIX) a luta entre o capital e os direitos dos trabalhadores nunca parou, quer a nível nacional como mundial; o confronto foi animado por grandes ideólogos, muitas vezes úteis para ditaduras brutais. Os sistemas políticos que dominaram o século XX foram marcados por estas ideologias que se confrontaram violentamente na economia e na guerra e, internamente, ocorreu também a luta entre as democracias e os autoritarismos, independentemente da sua origem filosófica.

Estes confrontos ideológicos criaram regimes que se confrontaram e alguns foram caíndo (fascismos, nacional-socialismo, comunismos). As superpotências nascidas da II Grande Guerra (EUA e URSS) protagonizaram esta luta em todos os campos da vida social, criando redes de aliados politico-económico-militares que lhes permitissem aumentar o seu poder. Foi uma luta de vida ou de morte, em que o combate final não ocorreu, já que a URSS implodiu em 1991, depois da queda do muro de Berlim em 1989; tinha ocorrido a rotura social, pois a economia não tinha capacidade de competir com o a do Bloco Ocidental. Era também a queda do comunismo, para muitos imprevísivel.

Foi o momento da grande vitória da economia de mercado em que se baseavam as democracias e estas foram-se expandindo por todo o mundo. Francis Fukuyama teorizou sobre o Fim da História (e enganou-se); regressaram as religiões, as fronteiras, as regiões, as etnias, os intereses nacionais, enfim, a Geopolítica que andava disfarçada, esmagada pelos superpoderes. Os EUA e os senhores do capital exultaram; o Papa João Paulo II, felicitando-se pela queda do comunismo, alertou que isso não poderia abrir as portas ao capitalismo selvagem. Alerta premonitório do que veio a ocorrer.

O desenvolvimento atingido em todas as áreas da ciência e da tecnologia provovou a chegada ao patamar final da globalização, deslocalizou empresas, integrou o comércio e fez emergir um capitalismo com base nos mercados e não na produção, criando enorme instabilidade e transferindo o poder para os detentores mundiais do capital, entidades não eleitas, sem controlo, que se regem apenas por interesses de lucro. Têm mais poderes que muitos Estados.

Acresce que a informação, a tecnologia e o comércio, agora mundializados, tendem para a igualização dos poderes nacionais que por necessidades próprias se foram endividando, embora a diferentes níveis. Alguns protegeram-se com cuidado. Outros foram gastando sempre à custa de um endividamento que atingiu o limite e foram arrastados pela crise de 2008 nos EUA.

Chegou o Outono do capitalismo histórico e o final da teoria de que os mercados se autoregulavam. Mais uma grande ideologia chegou ao fim com grande violência. Foi uma crise criada pela arrogância e pela ganância ilimitada. As vítimas deste confronto secular das ideologias contam-se por centenas de milhões e agora algo de novo tem de ser criado. A estrutura mundial do poder alterou-se, as regras da economia de mercado têm de ser mais firmes e acompanhadas. Portugal, com falta de visão e de estratégia dos seus sucessivos governantes caíu nesta armadilha mundial, agravando a sua situação por trinta anos de reformas não feitas. A União Europeia não havia sido preparada para este tipo de crise; não tem entidades, nem mecanismos para lhe fazer face e os mais fortes, se encostados à parede, irão reagir de modo egoísta. A União Europeia pode desaparecer e mais desastres podem chegar.

Nações históricas como Portugal podem desaparecer.... e depois? Depois, tudo pode acontecer e Portugal pode entrar no seu Titanic. A Sociedade Civil tem de impedir que tal aconteça e a PASC tem dado o seu contributo. No nosso caso, seria preciso que a míopia partidária desaparecesse e todos os Partidos (incluindo o PCP e BE) tomassem parte num verdadeiro Governo de Salvação Nacional, encontrando juntos soluções concretas para os problemas reais com a Sociedade Civil e abandonando a conversa partidária e de passa culpas de que todos estamos cansados.

Seria a reabilitação dos Partidos Políticos que sózinhos não vão lá. Se os seus responsáveis ainda não tiverem aprendido, as vítimas vamos ser todos nós, a Democracia e o País. No meio de tantos problemas e fraquezas ainda temos grandes virtualidades e potencialidades. Gostaria de, por uma vez, ver todos mobilizados na resolução dos problemas da Comunidade Nacional.

Lisboa, 29 de Outubro de 2012.

sábado, 27 de outubro de 2012

SISTEMA ELEITORAL: um artigo de Pedro Sousa Ribeiro.

 

por Pedro Sousa Ribeiro (Este texto representa apenas o ponto de vista do autor, não da PASC, nem das associações que a compõem).

 


Um artigo recente de Jorge Marques, publicado neste mesmo blog da PASC, levou-me a passar ao papel algumas ideias que tenho vindo a elaborar sobre o nosso atual sistema politico.

Diz Jorge Marques:

Uma assembleia que o povo votou mas que não escolheu, porque aqueles deputados são eleitos numa lista partidária e escolhida segundo esses interesses. Aos eleitores, aos cidadãos, pelo simples facto de colocarem uma cruz no boletim de voto de um partido, são agora atribuídas as responsabilidades pela humilhante situação a que chegámos.”

Efetivamente esta é a situação atual, que a não ser alterada, poderá levar a um bloqueio do nosso sistema politico, o que originará ruturas imprevisíveis.

Sendo assim, há que propor alternativas e, com este texto, pretendo dar o meu pequeno contributo. E irei abordar vários aspetos.

O sistema democrático assenta no princípio da eleição de representantes a quem o povo entrega determinados poderes. Os eleitos são, em teoria, responsáveis perante os seus eleitores.

Mas isto, como bem diz Jorge Marques, já não acontece em Portugal. Urge pois modificar o atual sistema.

Assim, e para moralizar a ação política, dever-se-á aproximar os eleitos dos eleitores, para o que proponho a formação de círculos uninominais com eleição direta nesses círculos.

Nesses círculos eleitorais, poder-se-á aplicar o sistema de eleição maioritária a 2 voltas. Caso um dos candidatos obtenha maioria absoluta na 1ª volta seria eleito. Em caso contrário passariam à segunda volta os 2 candidatos mais votados.

O sistema de círculos uninominais tem, no entanto, a desvantagem de limitar a eleição de membros de partidos minoritários. Para minimizar esta situação, os círculos uninominais seriam complementados por um círculo nacional em que a distribuição dos eleitos seria proporcional ao número de votos expressos.

Não vejo grande vantagem na redução de número de deputados, pois isso iria reduzir a relação eleitores/eleitos, mas sim criar um sistema que os leve a ter uma participação ativa.
 
E para que isso aconteça e seja visível :

  • os eleitos terão apenas duas alternativas: exercer o mandato ou renunciar a ele, deixando de ser permitido o esquema das substituições de mandato que têm apenas como objetivo atribuir mordomias a mais que um eleito ou permitir a escusa a determinadas votações mais incómodas. A definir, o regime para deputados que sejam chamados a exercer funções governamentais;
  • quem renunciar ao mandato não poderá ser candidato a qualquer cargo eletivo nas eleições imediatamente seguintes, quer sejam parlamentares ou locais;
  • terminar com o atual modo de anúncio de votações: a favor os partidos A e B, contra o partido C e abstenção do partido D, passando a anunciar o número de votantes a favor, contra e que se abstiveram. Isso obrigaria à presença dos deputados no plenário, pelo menos no momento das votações.

No que respeita ao poder local, sugiro o reforço dos poderes das assembleias municipais de freguesia. O presidente do executivo seria o primeiro da lista mais votada.

Parece-me que o princípio de executivos homogéneos será de aplicar, sendo os seus membros escolhidos entre os eleitos do partido mais votado para as respetivas assembleias. Caso não haja maioria absoluta de um só partido, os executivos seriam constituídos por coligações que possam alcançar essa maioria. Caberia às assembleias municipais e de freguesia, dotadas de poderes reforçados, a ação fiscalizadora.

quinta-feira, 25 de outubro de 2012

OS JOGOS OLÍMPICOS E O DESPORTO PORTUGUÊS: um artigo de Pedro Sousa Ribeiro.


por Pedro Sousa Ribeiro (Este texto representa apenas o ponto de vista do autor, não da PASC, nem das associações que a compõem).


 
Os recentes Jogos Olímpicos levam-me a tecer algumas considerações sobre a prestação da missão portuguesa e sobre o desporto português.

Os resultados obtidos estiveram dentro das expectativas realistas, tendo em conta o estado de desenvolvimento do desporto português. Prestações houve de bom nível, outras de nível médio e ainda algumas com prestações inferiores ao expectável. Convém, de qualquer modo, não esquecer que as atividades desportivas não são ciências exatas, havendo sempre aleatoriedade nos resultados. E certamente que todos os atletas que representaram Portugal se empenharam do modo mais intenso, quer na sua preparação, ao longo de anos de treino continuado, quer nas provas em que participaram.

Só os menos atentos ao fenómeno desportivo podem falar em resultados negativos. Como pretender que os resultados fossem melhores se Portugal é o país da Europa com menor índice de prática desportiva, não só da população em geral, mas também da população jovem? E está nos níveis mais baixos de todos os rankings existentes. E tem uma opinião pública ligada fundamentalmente a uma monocultura desportiva "que a cada dia se expressa nas palavras e na conduta de dirigentes políticos e desportivos deste país, reproduzidas e amplificadas na grande maioria dos órgãos de comunicação social e do "jornalismo" que se faz neste domínio”. E a situação de prática desportiva não tem tendência a melhorar. Se a iniciação se faz ao nível da escola primária e secundária, a atual proposta do governo para diminuir o número de horas semanais de educação física no ensino secundário irá certamente contribuir para um agravamento desta situação.

Cabe ao governo tomar opções e definir prioridades. Reduzir e desvalorizar a atividade física na escola é uma opção que acarreta a aceitação da degradação dos resultados desportivos a médio prazo.

Por outro lado, o investimento do setor publico no desporto é relativamente baixo, mas poderão as verbas disponíveis ser melhor utilizadas? Certamente que sim. Apenas um exemplo. O organismo de tutela, o IPDJ - Instituto Português do Desporto e da Juventude, estabeleceu em 2012 Contratos Programa com 60 federações desportivas. Tem isso justificação? Penso que não. Há também aqui que tomar opções e definir desportos prioritários. Apoiar esses mais fortemente e deixar de fora dos apoios públicos todos os outros. Numa primeira aproximação, excluir todos os não olímpicos, os motorizados e/ou os que não tenham relevância mundial.

No âmbito das Federações Desportivas, têm justificação a existência de dois órgãos de cúpula, o Comité Olímpico de Portugal e a Confederação do Desporto de Portugal? Vejo com vantagem , a exemplo do que acontece na maioria dos países europeus, a existência de um único organismo que albergue no seu seio todas as federações desportivas. Terão as federações desportivas a ousadia necessária para dar esse passo? Será esse organismo capaz de propor, em consonância com o órgão estatal correspondente, um plano nacional para o desenvolvimento desportivo? E depois zelar pela sua execução ?

No contexto político e económico atual, com a cultura desportiva existente, haverá condições para definir uma verdadeira política desportiva? Provavelmente, daqui a quatro anos, quando terminarem os Jogos Olímpicos do Rio, em 2016, estaremos a equacionar as mesmas questões.
 
 
13 de Agosto de 2012.

domingo, 21 de outubro de 2012

PORQUE FALTA VERDADE A ESTE SISTEMA POLÍTICO?: um artigo de Jorge Marques.


por Jorge Marques (Este texto representa apenas o ponto de vista do autor, não da PASC, nem das associações que a compõem).

 


Não se trata de uma má vontade continuada contra o nosso sistema político, mas sempre que a nossa vida colectiva se altera e perde aquela obediência canina, a caricatura do sistema aparece, como se tudo estivesse construído apenas para separar os que mandam dos que obedecem e tudo passasse apenas e só por aí.

Como se sabe, o Governo não é eleito directamente pelo povo, é o resultado, se quisermos um subproduto importante, da eleição parlamentar. A esse Parlamento compete aprovar o programa do governo, fiscalizar a actividade do governo, fazer a maior parte das leis, censurar o governo e permitir a sua demissão, aprovar o orçamento… e muitas outras mais coisas. Quer dizer que em boa parte, neste sistema, o governo emana e depende substancialmente do Parlamento.

Sempre que um Governo diz que um orçamento tem que ser aprovado, que não há alternativas a esse orçamento, que não há margem de manobra para alterar o que quer que seja, esse governo diz que o parlamento pode discutir, fazer o seu número, mas no fim tem que aprovar. Ou seja, a coisa volta-se contra o seu criador e reduz a menos que zero a sua existência ou pior ainda, faz uma inversão de papéis.

E porque é que isto acontece? Porque na nossa democracia, de um regime que se chama semipresidencial e não só presidencial ou só parlamentar, há duas entidades que regulam a actividade política e que devem estar em sintonia e que são, o Presidente da República e a Assembleia da República. Como se sabe também, são ambos eleitos directamente pelo povo e ao povo devem a lealdade do seu exercício, mais que isso, são subordinados do povo, dependem dele, porque eleger significa delegar e não alienar.

Ao longo de todo este tempo, quer o Presidente, quer o Parlamento, assistiram a um exercício governamental que em nada era coerente com o programa que aprovaram, era até o seu contrário, o que agravou sistematicamente a vida dos portugueses e destruiu o sistema económico e social; assistiram a uma total incapacidade do governo para resolver os graves problemas do país, para lhe dar um rumo, bem pelo contrário também, tudo ficou pior e sem orientação; assistiram a exercícios pouco claros, de ética duvidosa e aos quais se foi dizendo que estavam dentro da lei; assistiram a verdadeiros atentados à democracia e a quebras sucessivas de acordos e contractos, sejam políticos, sejam sociais; assistiram á maior movimentação de manifestações sociais depois do 25 de Abril; assistiram às críticas e ao rebate dos sinos de intelectuais, cientistas, profissionais credenciados e vindos de todos os quadrantes partidários e de gente independente; assistiram às ofensas directas à nossa classe empresarial, aos trabalhadores, pensionistas, funcionários públicos e ao trabalho em geral.

Assistiram a tudo isto e com a legitimidade que lhes competia e que resultava do voto popular, nada fizeram, mostrando um direccionamento errado sobre a quem deviam a verdadeira lealdade, comprometendo-se com um governo incompetente, um Primeiro Ministro impreparado e ficando contra o povo. Deve por isso ficar claro que quer o Presidente da República, quer a Assembleia da República, baluartes da democracia, são igualmente responsáveis por esta situação que vivemos, responsáveis por acção e omissão. Crise política é a degradação diária do país, é a má governação e não a ruptura com isso mesmo, porque o país está sempre primeiro. O que se tem defendido é um falso e aparente consenso, seja político, seja social. Um consenso de verniz, como alguém já lhe chamou.

Porque é que é falso este Sistema Político?

Porque quer os órgãos que são eleitos directamente pelo povo, quer os que emanam dessas eleições, apenas se regem pelo mesmo princípio ou seja, os interesses do poder partidário que os elege; porque o voto popular não parece ter qualquer significado no sentido do poder político, apenas cumpre uma formalidade para que alguma coisa de democracia ainda exista, mas formal apenas e não de facto; porque nada e ninguém nos defende de um mau governo e o resultado desses sucessivos erros e dessa incapacidade está à vista; porque não existe qualquer separação de poderes no sistema político, a fonte é sempre a mesma, ou seja, os partidos políticos; porque sempre que se questionam as alternativas a única resposta é a alternância dos mesmos agentes partidários; porque numa democracia representativa, todos os órgãos eleitos directa ou indirectamente, são representantes do povo, mas o que está a acontecer entre nós é que esse poder de representação se tem transformado em centros de poder próprio, em oligarquias dos partidos; porque o actual governo é de legitimidade duvidosa, a delegação que lhe foi dada não incluía este tipo de programa, mas um outro que foi sufragado e que por sinal tem um sentido completamente contrário à actual prática governativa; porque em nome de toda esta aparência, o nosso problema é apenas o de evitar uma crise política, manter estas aparências e não encarar a verdade dos factos.