segunda-feira, 8 de abril de 2013

A PROPÓSITO DE UMA NOVA NARRATIVA: um artigo de Jorge Marques.


por Jorge Marques (Este texto representa apenas o ponto de vista do autor, não da PASC, nem das associações que a compõem).

 

 

Pode ou não gostar-se do sujeito Sócrates, mas o homem parecia querer imitar um profeta, falava de tomar a palavra e repetiu mais de duas dezenas de vezes ao longo da primeira entrevista televisiva o conceito de narrativa nova, como se houvesse também uma velha narrativa. De tudo o que disse parece que aquilo que ficou e repetiu nos dias seguintes foi mesmo a ideia de uma Nova Narrativa. Até que ponto esse conceito tem fundamento e um novo significado? Vejamos:

  • O conceito clássico de inteligência, isto é, o ser racional, lógico e analítico, caiu muito nas bolsas de valores. Com a teoria das inteligências múltiplas e outras, ela passou a ser apenas mais uma entre muitas e nem sequer a mais importante. A causa tem a ver com as alterações profundas que se deram quer na sociedade, quer na economia e que passaram da Era da Informação que era linear e lógica para uma Era Conceptual onde domina a criatividade, a empatia e a holística.
  • Com este tipo de mudança, alteraram-se também as competências de base da Sociedade, das quais destaco, porque tem a ver com essa tal ideia da Nova Narrativa, uma que se denomina História e a outra o Sentido. História que é aqui o sinónimo de narrativa, isto é, a capacidade de colocar os factos num contexto, se quisermos, reunir texto e contexto e apresentá-lo com impacto emocional. Esta é a essência da Nova Narrativa, condensar conhecimento, contexto e emoção. O Sentido é depois o orientador dessa narrativa e funciona como verdadeiro propósito. Costuma mesmo dizer-se que nós nascemos para o Sentido e não para o prazer, a menos que este faça sentido. O Sentido, neste caso, tem depois dois tipos de avaliação, um individual e tem a ver com a variante passiva ou activa do Ego de cada um e a outra, que tem a ver com o valor moral social. Em qualquer dos casos, a narrativa só existe quando faz sentido para o próprio e ele fica satisfeito ou quando faz sentido para a sociedade. Mas reparem que estou ainda a falar de narrativa, porque quando queremos falar de Nova Narrativa, então entramos no espaço de uma Era Conceptual e isso passa a ter um outro significado. Neste caso, a narrativa com sentido passa a ser dominada pelo high touch que é uma capacidade de sentir empatia pelos outros, entender a subtileza das relações, encontrar satisfação dentro de si e ajudar os outros a fazer o mesmo, ir para além do comum, da trivialidade e da rotina. Se quisermos, a Nova Narrativa é sobrecarregada com mais valor da Moral Social.
  • Hoje vivemos ainda numa não narrativa, ou seja, num discurso daqueles que nos apresentam factos sobre factos, sem qualquer narrativa ou sentido. É esse o discurso dominante quer dos governos, quer das oposições, uns mais do que os outros. Dá para perceber que a satisfação desta não narrativa esta focalizada sobretudo no Ego Passivo dos seus narradores, isto é, aquele que é dominado pela insegurança, apatia, agressividade, autoritarismo e destruição de valores. Quer ainda dizer que a solução para as nossas crises, dificilmente poderá sair de tal falta de narrativa, precisaríamos no mínimo de um texto coincidente com o contexto, precisaríamos que esse Ego Passivo se fosse tornando Activo, ou seja, criativo, com capacidade de realização e capaz de superar obstáculos. Tudo isto teria que começar na aprendizagem e na prática de uma atitude aparentemente simples e que se chama Humildade, cujo significado é o de uma auto-estima inteligente.
  • É verdade que começamos a ter um esboço de narrativas, umas boas e outra más, algumas bem e outras mal organizadas. Infelizmente a má é a que está organizada, é a narrativa mediática dos partidos políticos que tem imposto aos media os seus mais variados comentadores, como quem diz, vão e contem-lhes histórias. O que está a acontecer é que evoluímos de uma não narrativa para uma narrativa viciada e de histórias incompletas. Tudo isto é pouco sério, porque não tem o contraditório da Sociedade Civil, da realidade maior deste país e em nome da qual todos dizem falar. E porque será que a narrativa da Sociedade Civil não passa nos media? Talvez porque essa seja mesmo Nova e ponha em causa todas as outras que ficariam sem graça, talvez porque resistimos sempre ao Novo e preferimos as imitações.
  • O que faltará então para que se possa falar de uma Nova Narrativa? Em primeiro lugar precisamos construir uma narrativa com sentido e suportada num texto e contexto coerentes. Isto não quer dizer igual, quer dizer que ela é capaz de respeitar toda a diversidade da Sociedade e não apenas a dos partidos políticos. É uma quase narrativa ou uma narrativa viciada, por exemplo, tudo o que opõe os discursos dos governos e oposições, as explicações sobre a boa e má governação, sobre a verdadeira representatividade da Assembleia, sobre a independência do PR, sobre a competência e credibilidade de alguns governantes, sobre as negociações e avaliações da Troika, sobre tudo o que os governos dizem que é para bem do povo;
  • É o começo de uma Nova Narrativa as duas páginas do último Expresso, quando dá um enorme título e mensagem “ A Solução para Portugal está na Sociedade Civil”. Somos naturalmente por uma Nova Narrativa, mas que comece desde logo por ser aquilo que a define…uma história com sentido e, em boa verdade, o nosso Sistema Político perdeu esse sentido!

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